sábado, 24 de novembro de 2012

Smooth Criminal - Capítulo 7 - Smooth Criminal


Era como estar me afogando em um oceano cada vez mais fundo. Quanto mais eu me esforçava a subir até a superfície, mas eu sentia como se algo me levasse sempre para baixo. Não havia nenhum sinal de luz ou oxigênio. Não havia frio nem calor. E embora eu parecesse estar me afogando, nada doía em mim. Meus pulmões lutavam pela busca de algo inexistente. Será que estou morto?
Minhas suspeitas foram desmentidas quando consegui finalmente abrir os olhos, e me encontrei de volta ao presente, sentado no sofá enquanto Annie me olhava preocupada, ajoelhada no chão a minha frente. A preocupação nos olhos dela era banhada por lágrimas que ainda não tinham sido escorridas.
Sentia meu coração tremer de agonia e o ar ainda parecia faltar em meu pulmões - embora aparentemente eu já parecesse ter chegado a tal superfície onde o oxigênio me aguardava.
Meu corpo congelou enquanto o peso da culpa, caindo sobre mim, fez com que ele se encolhesse, humilhantemente. Toda a frustração guardada dentro de mim transbordou, e vazou em lágrimas teimosas.
– Me perdoe... Me perdoe... – eu repetia entre os soluços.
– Está tudo bem agora. Você se lembrou. – Annie tentou me tranqüilizar me abraçando e fazendo com que eu levantasse a cabeça para encarar os olhos verdes.
– Eu matei você. Eu... Me perdoe... – continuava sem ter mais o conhecimento normal do sentido das palavras que eu mesmo pronunciava.
– Não há o que perdoar. Foi um erro que qualquer um poderia ter cometido. Não podemos mudar nada do passado. Mas eu estou aqui para mudar o presente. – Annie falava com convicção e clareza no tom de voz calmo – Bill, me escute, você tem que acordar agora.
– Acordar? – a surpresa em contraste com as lágrimas.
– Sim. Você pode acordar agora. Eu vou ficar bem, faça o mesmo. – a voz dela tomou um tom deprimente enquanto ela me abraçava mais forte.
Annie me encarou com os olhos verdes, o rosto a centímetros do meu. Ela não respirava mais, e os olhos perdiam, aos poucos, o brilho de antes.
– Por favor, não se esqueça nunca mais... – ela murmurou me presenteando com o sorriso infantil e tocando os lábios avermelhados nos meus pela ultima vez.
E, antes que eu pudesse prometer nunca mais esquecer, eu me encontrava novamente na escuridão do oceano que roubava o ar de meus pulmões.
Dessa fez eu não lutei para chegar à superfície. O desgosto apenas fez com que eu permanecesse ali por muito mais tempo do que da primeira vez. Estava já me acostumando com aquela condição de “quase morto” quando me lembrei...
Eu vou ficar bem, faça o mesmo.
Então meu corpo voltou à superfície...

Meus olhos se abriram devagar, tentando se acostumar com a luz do ambiente. Sol...
As paredes do quarto eram bege, muito claras, o que fazia com que a luz do sol – que entrava pelas enormes janelas de vidro – parecesse ainda mais forte. Eu estava deitado em uma cama no centro do quarto, lençóis da mesma cor das paredes me cobriam. Um bip em um aparelho marcava as batidas do meu coração. Meu corpo estava dormente, como se ele tivesse sido mantido na mesma posição durante dias. Minha cabeça doía um pouco e minha visão começava a se normalizar.
Finalmente a porta do quarto se abriu. Uma mulher loira de cabelos curtos segurou um grito de surpresa a me ver acordado.
– Bill... – ela se aproximou devagar, cautelosa.
– Mãe? – perguntei sem ter certeza, minha voz falhava um pouco e minha boca estava completamente seca.
– Mein Gott! – ela correu em minha direção, se debruçando para me abraçar.
Simone me largou do abraço, rindo e chorando ao mesmo tempo.
– Tom! Ele acordou! – ela gritou enquanto a porta do quarto se abria novamente e um menino de tranças negras entrava no mesmo, me olhando espantado. Meu reflexo no espelho...
– Bill! – Tom fez o mesmo que Simone antes, correndo e me abraçando, só que com menos cautela, o que vez meus músculos doerem por inteiro. – Ah, desculpa. – ele se desculpou sem graça ao ver minha cara de dor.
– Graças a Deus você acordou. – Simone falou enquanto apertava minha mão com força – Vá chamar o doutor, Tom.
Após bagunçar o meu cabelo sem jeito, Tom fez o que lhe pediram.
– O que aconteceu? – perguntei quando só restou eu e Simone no quarto de hospital bem iluminado.
O sorriso dela sumiu, dando lugar a frustração.
– Você levou um tiro. Graças a Deus não foi grave, a bala passou de raspão. – ela suspirou e se sentou na cadeira ao lado da cama onde eu estava – Mas, por um motivo que nenhum médico soube explicar, você ficou em coma.
– Coma... – murmurei me lembrando dos domingos repetidos que eu havia vivido – Quanto... Quanto tempo eu fiquei assim?
– Foi pouco. Menos do que todos esperava. – ela voltou a sorrir – Apenas cinco dias. Mas agora você parece ótimo. Infelizmente, não posso dizer o mesmo sobre Annie. Bill, ela...
E então Tom voltou ao quarto, seguido pelo médico.
Não era necessário que Simone terminasse a frase, para que eu soubesse o que havia acontecido. Annie está morta por minha causa...

Eu fiz todos os exames necessários e fiquei algum tempo em observação. Aparentemente, não havia nada de errado comigo, e eu pude voltar pra casa logo.
Todos me olhavam com pena, e isso fazia com que eu odiasse cada vez mais a mim mesmo. Se eles soubessem...

Mantive minha promessa, e nunca me esqueci. Nem poderia. Embora Annie estivesse morta para todos, ela parecia viver em minha mente todos os dias.
Eu queria gritar ao mundo o quanto eu era culpado em tudo o que acontecera. Livrar-me pelo menos de uma parte dessa culpa. Mas eu não conseguia.

Annie tinha razão. Não há nada que puna um homem mais cruelmente do que ele próprio. Minha mente é minha prisão. As lembranças, as grades que me mantêm preso no mesmo lugar, sem me conceder a liberdade jamais.
Esse é meu castigo eterno. A pena criminal concedida por mim mesmo.

Postado por: Grasiele | Fonte

Smooth Criminal - Capítulo 6 - Scream


Eu fiquei longos minutos em plena escuridão. É claro que pra mim deve ter durado mais do que realmente durou. Até que um forte clarão surgiu e, quando abri os olhos novamente, eu me encontrava dentro de meu carro.

Havia acabado de sair de meu próprio apartamento e me dirigia ao apartamento dela.
Finalmente cheguei ao meu destino.
Estacionei o carro, peguei o elevador até o andar certo e parei na porta certa.
Toquei a campainha, uma, duas vezes, ninguém atendeu. Rodei a maçaneta e percebi que a porta estava destrancada.
Já estava cansado de avisá-la sobre o perigo que corria por culpa de sua enorme falta de atenção. Aquele prédio velho onde ela morava não tinha segurança alguma. Não trancar a porta do apartamento não era uma atitude muito esperta.
É claro que eu tentei convencê-la inúmeras vezes para vir morar comigo. Meu apartamento era luxuoso e seguro, de acordo com minha ótima condição financeira. Confortável o bastante para vivermos juntos.
Mas ela era teimosa de mais. Insistia em continuar ali, até que nos casássemos.
Entrei no apartamento, sorrindo. Aquilo não era mais uma condição a se discutir.

Ela não estava na sala nem na cozinha minúscula, por isso segui direto para seu quarto.
A porta estava entreaberta, empurrei ela com cuidado para poder entrar no quarto.
Annie estava deitada na cama, perdida em sonhos profundos.
Sentei-me na ponta da cama, ao lado dela, e tirei com cuidado uma mecha vermelha de cabelo que lhe escondia o rosto sereno.
Levantei a cabeça para encarar o por do sol. A luz vinda dele ultrapassava a janela sem cortinas.
Segurei o riso repentino, lembrando-me das vezes que tentei forçá-la a comprar cortinas para as janelas de seu apartamento, quando eu passava a noite com ela e sempre acabava acordando com o sol forte batendo nos meus olhos e os fazendo abrir contra a própria vontade. “Cortinas impedem o sol de entrar e iluminar o que precisa ser iluminado. São desnecessárias!”, a mesma resposta era sempre dada por ela a minha insistente proposta.
Talvez ela tivesse mesmo ração.
Em contraste com a pele clara do dedo-anelar dela, pousando nele como se fizesse parte do mesmo, o anel de noivado brilhava sobre a luz do sol.
– Bill... – Annie despertou, abrindo os olhos devagar.
A íris verde pareceu brilhar a luz do sol tanto quanto a esmeralda do delicado anel.
– Oi. – sorri enquanto ela se levantava e se sentava do meu lado.
– Pensei que não ia voltar mais. – ela retribuiu o sorriso.
– Eu não ia. – admiti, sem saber ao certo por que o fiz.
– Não importa. Fico feliz que tenha voltado. – falou, tocando os lábios rosados nos meus.
Annie pousou a cabeça em meu ombro, quase voltando a dormir.
– Como consegui dormir tanto? – perguntei rindo, enquanto bagunçava o cabelo dela.
Ela riu também, passando a mão nos próprios cabelos, tentando ajeitar o que eu havia bagunçado.
– Bem que eu queria dormir mais, mas acho que estou morrendo de fome. – ela fez uma careta engraçada enquanto prendia os cabelos ruivos num rabo de cavalo desgrenhado.
– Me deixe adivinhar... – falei fingindo pensar por um instante e continuei em seguida – Você não fez compras de novo?
Ela me olhou, ainda fazendo a mesma careta engraçada de antes, e balançou a cabeça numa negativa.
– Está bem. Eu passo agora mesmo no mercado, contanto que você vá pra minha casa hoje. – falei, já me levantando.
– Mas já está anoitecen... – Annie interrompeu a si mesma, abaixando a cabeça e ficando em silêncio.
Por um momento jurei ver uma sombra passar pelos olhos de esmeralda, mudando completamente a expressão sonolenta de Annie.
Certamente um engano, pois quando ela levantou a cabeça para sorrir pra mim, sua expressão estava completamente serena.
– Está bem. – ela concordou com a condição.
– Ótimo. – encostei os lábios na testa dela e me despedi saindo do quarto enquanto ela voltava a se jogar na cama – Volto logo.
Antes de sair do apartamento, fui até a cozinha e abri a geladeira para saber o que tinha ali e o que não tinha.
Qual não foi minha surpresa quando meus olhos procuraram e encontraram apenas uma caixa de leite sozinha no fundo da geladeira.
Peguei a caixa. Vencido. Balancei a cabeça, reprovando o desmantelo da dona do apartamento.
O calendário foi parar no chão quando eu bati, sem querer, com muita força a porta da geladeira. Debrucei-me para pegar o papel do chão.
Meus olhos caíram em cima da data de hoje, que era destacada por um coração feito de caneta vermelha. 16 de agosto. Sorri quando me dei conta do motivo daquele dia estar destacado. Naquela mesma manhã eu havia lhe feito a pergunta, recebido a resposta, e dado o anel de esmeralda que seria prova de tudo isso.
Sai do apartamento, sem me esquecer de jogar a caixa de leite fora no caminho. Quando já estava quase porta a fora, ainda pude ouvir o telefone tocar, e, como ninguém atendeu, o telefonema caio na secretária eletrônica. Não me preocupei com isso. Se fosse mesmo importante deixariam recado, ou tentariam ligar mais tarde.

Dentro do supermercado não havia quase ninguém. Eu agradeci aos céus por isso. A última coisa que eu queria era ser parado por algum fã descontrolado. Naquele dia eu não me sentia como um astro da música, e sim como alguém normal, propício a me apaixonar como qualquer outra pessoa. Não que eu esperasse que isso realmente acontecesse. Eu não esperava me casar nunca. Nem queria isso. Mas eu sabia que estava tomando a decisão mais correta de toda minha vida.
Depois de passar algumas besteiras no caixa do supermercado, eu segui de volta à BMW.
Enquanto eu andava até o carro cinza, um vento forte fez meu corpo todo tremer de frio. Aprecei-me em entrar no carro para fugir do frio.
Finalmente eu já estava seguindo de volta para o apartamento de Annie.

Quando parei o carro na vaga de estacionamento do prédio e desci para seguir até o elevador, o mesmo vento ainda continuava a soprar com mais força do que antes. A lua iluminava tudo em volta, com uma luz azulada, um tanto sinistra. Eu já não sabia se o motivo para os pelos da minha nuca estarem se eriçando era mesmo pelo vento, que trazia um frio horripilante, ou se havia algo a mais.
Encolhi-me dentro da blusa de moletom, tentando me manter protegido do frio e entrei, as presas, no elevador.

O elevador parou no andar desejado e eu desci seguindo até a porta do apartamento de Annie.
A porta estava entreaberta, e um saco de lixo se encontrava jogado em frente da mesma. Imaginei que Annie estivesse indo levar o lixo para fora, quando algo a fez voltar pra dentro do apartamento. O telefone tocando novamente, talvez.
Mesmo esperando que minha lógica estivesse certa, empurrei a porta com cuidado, sem fazer muito barulho.
Entrei no apartamento na ponta dos pés. Foi quando escutei um soluço de choro contido que fez meu corpo tremer internamente.
Quando eu estava quase na entrada da sala, Annie já se encontrava em meu campo de visão. E não só ela.
Um homem segurava uma arma contra a cabeça de Annie. Ele exigia que ela lhe contasse onde havia dinheiro no apartamento. Eu sabia que Annie não guardava dinheiro em casa. Eu sabia que tinha que agir de alguma forma...
Por sorte eu não estava no campo de visão do ladrão armado, o que me dava certa vantagem.
Dei um passo para trás e tentei pensar em algo para fazer.
Minhas pernas estavam amolecendo e o chão parecia se dissolver sobre meus pés, eu sentia que poderia vacilar e cair a qualquer momento.
O choro de Annie ecoava em meus ouvidos, enquanto eu sentia minha visão se distorcer aos poucos.
Eu precisava agir logo. Foi quando eu lembrei que Annie havia sido policial tempos atrás, mas logo partiu para outro emprego, como de costume.
Eu tinha consciência do que ela ainda guardava na gaveta da cômoda, essa que se encontrava do meu lado, no corredor que dava na sala de estar, onde Annie ainda era ameaçada pelo homem descontrolado.
Eu não agia mais racionalmente. Com cuidado abri a gaveta da cômoda e tirei o revolver de dentro dela, sem fazer barulho algum.
Senti o suor escorrer pelo meu rosto enquanto eu destravava a arma de fogo.
Na sala, eu pude ouvir o homem ameaçar atirar em Annie, e sem esperar que mais nada passasse por minha cabeça – algo mais lógico talvez -, eu corri pra sala. E sem dar a chance do homem ou de Annie falarem ou agirem, eu atirei.

Um erro que eu mesmo jamais poderia perdoar. Um erro cometido por mim próprio.

Fechei os olhos antes de atirar. Eu nunca havia nem sequer pegado em uma arma antes. Já seria um desastre se eu tivesse mirado e mantido os olhos abertos, segurando com firmeza o revolver. Foi um desastre maior ainda por eu não ter feito nenhuma dessas precauções.
Minha bala atingiu o alvo errado.
Annie agora caia, uma poça de sangue envolvia seu peito. Sangue esse que agora inundava o chão em volta dela.
Eu ainda não acreditava no que eu havia feito. Estava prestes a cair no chão por conta própria, quando o homem, alarmado e um tanto desesperado, atirou em mim.
Meu corpo bateu contra o chão enquanto o homem saia do apartamento as presas.
Senti um liquido quente descer por minha cabeça.
Meus ouvidos pipocavam. Minha visão, após ver a poça de liquido vermelho que envolvia minha cabeça, se apagou completamente.
– Bill... – antes de perder a consciência por inteiro, ainda pude ouvir a voz doce e que agora falhava - por inteira e completa culpa minha – gritanto por seu assassino.

Postado por: Grasiele

Smooth Criminal - Capítulo 5 - In The Closet


Acordei com o sol batendo, quente, no meu rosto. Malditas janelas. Como alguém consegue viver sem cortinas?
Por fim, me levantei devagar, do mesmo jeito que eu havia acordado nos últimos dois dias. Aliás, tudo naquele apartamento estava igual, dando a impressão de que os dias não passavam, como se o tempo tivesse parado em algum momento incerto.
Comecei a rir abobalhadamente, prestando atenção em meus pensamentos, que, ultimamente, não estavam muito “normais”.
Fui pro banheiro e coloquei a cabeça pra dentro do chuveiro, deixando que a água quente me despertasse.
Tive que me lembrar de Annie, e de que ela não fazia parte de um sonho. Tudo o que eu havia vivido até agora era real. Embora às vezes parecesse que não.
Uma realidade ilusionista. Talvez toda realidade seja ilusionista afinal.

Sai do banho, me vesti e fui pra sala de estar do apartamento minúsculo e velho.
Sentei-me no sofá, foi quando vi que a luz vermelha da secretária eletrônica estava desligada.
Olhei para o mostrador do relógio ao lado do telefone. Ele indicava 11hrs e 50min. Perguntei-me se Annie havia escutado a mensagem, mas exclui logo essa alternativa. Afinal, ela havia ido embora e eu fiquei na sala a noite toda.
Talvez eu tivesse imaginado a luz vermelha antes. Era só imaginação...

Fui até a cozinha e abri a geladeira, só por curiosidade. Dei um passo pra trás de susto quando vi, solitária no fundo da geladeira, a caixa de leite vencido.
O que aquilo significava? Que brincadeira de mau-gosto era essa? Eu tinha certeza de ter acabado com aquele leite e ter feito compras no super mercado perto dali no outro dia. Ou talvez não...
Minha cabeça começou a latejar, de repente, sem motivo aparente.
Sem querer, bati a porta da geladeira com muita força, fazendo o calendário pendurado nela balançar e cair. Endireitei-me e peguei o papel caído no chão.
Um coração em vermelho, marcando um dia de domingo, chamou minha atenção, fazendo com que meus olhos caíssem alarmados, no tal dia do mês.
– Dezesseis de agosto... – sussurrei, paralisado.
Minhas mãos foram levadas intencionalmente à minha boca, que se abriu num grito contido de surpresa.
Minha cabeça começou a girar e eu pensei que iria desmaiar quando ouvi um pipi agudo, vindo da secretária eletrônica.
Arrastei-me até a sala. Minhas pernas pareciam sem resistência alguma, prontas para desabarem a qualquer momento.
Cai no sofá enquanto ouvia a seguinte mensagem:
“Oi. Você ligou pra mim, mas teve o azar de não me encontrar. Quem sabe você tenha a sorte de me deixar uma mensagem e eu escutá-la em breve! Ou não...”
Era a voz de Annie. Franzi a testa em linhas de pura dúvida.
Parecia que a cada segundo algo mudava o curso de uma história absurda, de roteiro cada vez mais duvidoso e confuso.
Meus olhos se arregalaram a ouvir a voz conhecida após o sinal da secretária eletrônica:
“Oi Bill! Oi Annie! Eu não encontrei o Bill no apartamento dele e logo contatei que ele estivesse ai com você, Annie. Só liguei pra avisar que minha viagem à França está sendo um verdadeiro sonho! Não se preocupem em me atender. Não precisam parar de fazer nada que vocês estejam fazendo...”
E após risadas descontroladas, Tom se despediu e desligou o telefone.
Eu sentia lágrimas começarem a serem formadas em meus olhos, sem motivo algum, como se tivessem vontade própria.
– Bill? - Annie apareceu e se sentou do meu lado tocando em meus ombros, preocupada.
Foi quando me dei conta de um fator favorável a Tom naquele instante. Levantei-me num pulo do sofá, as lágrimas em contraste com um sorriso amarelo.
– Annie, Tom não matou você! – afirmei, certo do que dizia – Ele estava viajando. Não tinha como ele...
Interrompi a mim mesmo. Como eu podia afirmar algo assim se nem ao menos sabia...
– Você foi assassinada em que dia, Annie? – perguntei com cautela.
Annie levantou o olhar frio para dirigi-los a mim.
– Dezesseis. – a voz dela suou sombria e estranha – Dezesseis de agosto.
O ar pareceu começar a faltar. Isso só podia ser um engano. O tempo não podia parar como se isso fosse normal.
– Tom não te matou... – voltei a afirmar, mas para convencer a mim mesmo do que a ela.
– Eu sei. – Annie se levantou, a voz fria como a expressão estampada no rosto rígido.
– Sabe? – indaguei, a voz falhando, deixei meu corpo cair no sofá, antes que eu desmaiasse.
Um angustiante silêncio se seguiu, me torturando. Meus olhos paralisados em cima de Annie. Os dela dirigidos para fora da janela.
O silêncio só foi quebrado quando Annie voltou a me olhar, sem nenhum sentimento nítido no rosto, e então, sua voz firme como aço - muito diferente da voz de sinos que eu estava acostumado - fez-se ouvir.
– Tom não me matou Bill. – ela deu um passo em minha direção – Você fez isso.
Senti minhas pálpebras se dilatarem. O que ela estava afirmando. Eu...
– Você é meu assassino Bill. – ela concluiu por fim, voltando o olhar irracional para a janela.
O ar já me faltava completamente. Minha cabeça parecia se dilacerar em segundos. Minha visão começava a se apagar. Meus ouvidos não captavam mais nenhum som.
E, então, meus olhos se fecharam completamente, me dando as imagens das lembranças, até então, esquecidas e perdidas pela minha própria vontade. Como se elas tivessem sido trancadas por mim mesmo dentro de um armário velho e esquecido no canto da sala, e agora eu fosse forçado a abrir esse armário e me deparar com seu conteúdo.

Postado por: Grasiele

Smooth Criminal - Capítulo 4 - They Don't Care About Us


Não sei quanto tempo eu fiquei ali, jogado no sofá da sala, sem mover um centímetro sequer de qualquer músculo do meu corpo. O frio continuava, e os arrepios eram constantes. Meus olhos continuavam fixados na luz vibrante da secretária eletrônica. Minha cabeça doía com o choque das informações armazenadas. Informações que minha cabeça era forçada a guardar, mas meu coração insistia em não aceitar nenhuma delas.
Fantasmas. Assassinatos. Em que hospício eu havia caído e permanecido durante esses dois dias?
– Bill. – Annie surgiu do mesmo modo que sumira antes – As pessoas erram, sabe... Isso é normal. – ela murmurou se sentando na beira do sofá.
Eu não estava no melhor momento de mim. Aliás, eu nem estava parecendo comigo naquele instante. Minha mente estava completamente atordoada. Eu sabia que era um péssimo momento para tentar argumentar com ela, mas as palavras – que devem ter suado como punhais nas costas, para Annie – me saltaram da boca, sem que eu tivesse a chance de impedir isso.
– Toda vitima é cúmplice de seu algoz. – sussurrei, sem dirigir um olhar a ela.
Mesmo sem olhar a expressão de Annie, eu quase pude a sentir tomando a expressão de indignação e tristeza. O ar pareceu até mais pesado de se respirar.
Por um instante eu senti o arrependimento cair sobre mim. Mas tentei afastá-lo, agora era tarde demais. O que havia sido tido não poderia mais ser retirado.
– Você está querendo dizer que eu tive culpa em meu próprio assassinato? – a voz dela suou deprimida e fria, como gelo.
Sentei-me no sofá e a olhei. Ela estava de cabeça baixa, as mãos cerradas em punho, os nós dos dedos estavam brancos, tamanha a força com que ela os apertava.
Respirei fundo e revi minhas próprias idéias, me forçando a voltar ao meu eu normal.
– Me... Me desculpe, Annie. – pedi, abaixando a cabeça, deixando que finalmente o arrependimento caísse sobre mim, com todo o seu peso torturante.
Ela respirou fundo. Pude ver os nós de seus dedos voltando à cor normal, enquanto ela relaxava os músculos.
– Está tudo bem. – ela me olhou e sorriu – Eu entendo o seu lado, só peço que entenda o meu, mesmo que seja difícil.
– Eu entendo. – falei sem nenhuma certeza.
– Hm. – ela murmurou erguendo uma das sobrancelhas, parecendo perceber minha falta de convicção. - Não vou ficar aqui essa noite. Espero que você fique bem.
Annie se levantou do sofá, se preparando para ir embora novamente.
– Eu ficarei... – sussurrei, a vendo sumir como antes: num lampejo.
Joguei-me no sofá mais uma vez. Fiquei com os olhos pregados no teto, pensando.
A dor de cabeça parecia aumentar a cada milésimo de segundo. A dor era estranha, diferente da dor de cabeça com que as pessoas estão acostumadas. Era como se minha cabeça procurasse em seus arquivos uma resposta a uma pergunta, ambas desconhecidas por mim. Como se essa resposta estivesse em alguma lembrança esquecida à força. Uma lembrança tão difícil de ser encontrada que chegava a não parecer pertencer a mim.
E foi assim, forçado a tentar encontrar algo que parecia perdido para sempre, que eu adormeci, ali mesmo, jogado naquele sofá velho cheirando a um perfume que não era meu, mas me era familiar.

Postado por: Grasiele

Smooth Criminal - Capítulo 3 - Man In The Mirror

O sol que nascia vermelho no horizonte, tocou minhas pálpebras fazendo-as se abrirem de vagar. Levantei-me sem presa, me sentando na cama e olhando através do vidro da janela. Era tudo tão estranho ali. Nada parecia ser como eu desejaria que fosse. Por que eu não teria comprado cortinas para as janelas de meu próprio apartamento? Sem contar que nada parecia ser realmente meu.
Fiquei de pé com relutância, e fui até a janela. Observei a rua vazia. Parecia tão fácil invadir aquele prédio velho. Não fazia sentido eu morar ali. Afinal, eu tinha condições financeiras para assegurar meu conforto e segurança.
Balancei a cabeça sem entender o rumo dos meus próprios pensamentos. Qual era o objetivo da minha mente afinal?
Talvez meu inconsciente estivesse pregando peças em meu consciente para que eu acabasse preso a uma camisa de força no fim.
Depois do sonho com a tal ruiva, Annie, que eu tivera naquela noite, eu não duvidaria dessa teoria.
Peguei uma toalha e fui direto pro banho. Talvez a água quente lavasse todas as minhas duvidas e angustias.
Eu sentia a água quente cair, relaxando meus músculos, quando vi, pelo box, uma silhueta feminina entrar no banheiro. Abri a porta do box, assustado, e encontrei os olhos verdes me encarando. Suspirei, talvez aliviado, e recebi um sorriso infantil de volta.
– Então, não foi um sonho. – constatei voltando ao banho.
– Por que haveria de ser um sonho? – ela perguntou, com tom de falsa indignação.
– Não sei. – admiti.
– Eu te garanto que não foi, e nem é um sonho. – Annie assegurou com a voz um tanto abatida.
Nos segundos que se seguiram o único som que podia ser ouvido era o da água caindo do chuveiro.
Uma pergunta um tanto idiota, me veio em mente, e eu não pude me conter em não fazê-la.
– Annie, como é estar morto? – indaguei com cautela, enquanto fechava o chuveiro e me secava com a toalha.
Ela não mostrou surpresa pela pergunto e a respondeu sem mudar o tom de voz abatido.
– Por que eu te responderia, se um dia você poderá responder por si próprio?
Abri o box para encará-la, ela levantou a cabeça e me olhou com uma das sobrancelhas arqueada, num ato de indagação.
Sorri, admitindo que ela estava certa. Um dia todos terão essa resposta.
De repente me lembrei que eu deveria ir trabalhar. Bati a mão na testa com a lembrança mal vinda.
– Tenho que trabalhar hoje... – gemi começando a me trocar.
– Não tem não. – ela me olhou, estranhando-me e seguiu até a porta, abrindo-a – Hoje é domingo. – dizendo isso ela saiu do banheiro, fechando a porta em seguida.
Domingo? Algo me dizia que havia algo errado quanto a isso. Mas meu corpo cansado, agradecia pelo feriado, fazendo meu cérebro parar de questionar sobre o assunto.
Vesti-me e fui encontrar com Annie na sala de estar. Senti um frio estranho, sem motivo algum, afinal, era verão, e fazia sol lá fora.
Esfreguei uma mão na outra, tentando espantar o frio e acabar com os arrepios que me percorreram a espinha.
Annie estava sentada no sofá. Ela segurava minha carteira, observando na mesma uma antiga foto, minha e de meu irmão gêmeo. Sentei-me do lado dela e fiquei olhando a foto também.
Na foto, eu e Tom andávamos a cavalo numa fazenda onde nossa mãe havia nos levado a passeio. Lembro-me de ter odiado a “excursão” à vida rural. Não fui mesmo feito para viver ao ar livre.
Annie parecia uma estatua, imóvel. Seu rosto estava abaixado, impedindo que eu pudesse ver sua expressão.
– Está tudo bem? – perguntei, preocupado.
Ela me devolveu a carteira, sem levantar os olhos.
– Annie, está tudo bem? – insisti.
Ela pousou o rosto sobre as duas mãos. Sua respiração começou a ficar descontrolada, como se ela estivesse entrando em pânico.
Pensei em abraçá-la, mas seria um ato inútil.
Por alguns segundos ficamos ali, imóveis e em silêncio. Eu apenas escutava a respiração acelerada, sem me mover, sabendo que qualquer ato meu seria em vão.
Aos poucos, a respiração dela se normalizou. Então ela levantou a cabeça. Seus olhos estavam fechados.
Annie respirou fundo e abriu os olhos devagar, como se recobrasse a consciência.
– Bill, - ela murmurou, a voz fria e firme – eu encontrei meu assassino.
– Mesmo? Quem? – perguntei espantado.
Annie respirou fundo novamente e me respondeu sem se alongar na pronuncia de cada palavra.
– Tom, seu irmão, ele é meu assassino.
O ar pareceu me faltar quando a resposta chegou a meus ouvidos. O chão de meus pés pareceu se dissolver, se preparando para me engolir vivo.
Recuperei o ar e a olhei indignado com a acusação.
– Você deve ter se enganado. Tom, não seria... – tentei argumentar, mas ela me interrompeu.
– Não seria capaz disso Bill? – ela me olhou, o olhar frio e cruel – Por quê? Por que ele é seu irmão? Por ter o mesmo sangue que você?
Abri a boca para respondê-la arrogantemente, mas Annie continuou antes de mim.
– Ou será por que ele é tudo que você não é? O seu contrário. Sua imagem refletida no espelho. – Annie me fitou furiosa e, num lampejo, sumiu em seguida.
Deixei meu corpo cair no sofá. Aquela acusação era muito grave. Eu não podia acreditar. Na verdade, eu não queria.
Minha cabeça começou a latejar sem piedade. Pontadas de dor intercaladas com angustia e incapacitação me percorriam o corpo inteiro.
Eu sabia que não seria capaz de prosseguir daquele ponto em diante. Não poderia acusar meu irmão de assassinato se eu mesmo me recusava a culpá-lo por tal crime.
Na frente do sofá, na mesa de telefone, a luz vermelha da secretária eletrônica piscava sem parar, indicando mensagem nova. Tive vontade de escutar a tal mensagem, mas algo me disse que aquele não era o momento para recados eletrônicos.

Postado por: Grasiele

Smooth Criminal - Capítulo 2 - You Are My Life


Ela era a mulher que eu amava. Com quem eu escolhera passar os meus dias. Nós éramos felizes e tínhamos planos para o futuro. Eu já havia feito a proposta, e ela já havia me respondido, feliz, com as três letras, que juntas formavam a única palavra que eu aceitaria escutar: sim!
Nunca pensei que eu chegaria a esse ponto. Mas eu a amava como também nunca pensei amar alguém.
O que havia acontecido para eu esquecer tudo aquilo...
Ela finalmente desviou os olhos das estrelas para dirigi-los a mim. Annie parecia forçar um sorriso - que mesmo forçado ainda era infantil e inocente.
Levantei-me do sofá, atravessei a sala em passos lentos e cautelosos até ela.
Na mão direita, como se fizesse parte do dedo anelar, o anel de noivado repousava. Ele era fino e delicado, no centro uma pequena esmeralda – tão verde quanto os olhos da usuária do anel - era sustentada pela armadura de ouro branco, minúsculas pedras de diamante brilhavam circulando a pedra verde, dando a ela o maior destaque.
– Bill, eu preciso... – Annie começou a falar quando eu já estava na frente dela.
Levantei minha mãe para tocar-lhe o rosto, mas foi como tentar tocar o ar. Minha mão a atravessou, como nos filmes.
Dei um passo para trás, assustado. Annie abaixou a cabeça e deu um suspiro, longo e deprimido.
– Você não pode me tocar, Bill... – ela falou, sua voz era quase um sussurro, me esforcei para poder ouvi-la – Eu estou morta.
Senti minhas pupilas dilatarem quando a ultima palavra tocou meus ouvidos. Morta... Isso só poderia ser um sonho. Eu ainda devia estar dormindo.
– Co... – respirei para que o que eu dissesse fizesse algum sentido – Você está de brincadeira, não é mesmo?
– Infelizmente, não! – ela foi clara e sua voz agora parecia ter aumentado o volume e a convicção.
– Você não brincaria com uma coisa dessas. – conclui. Além de que, minha mão havia mesmo a atravessado como se ela não estivesse ali, como se ela fosse apenas um holograma de computador.
– Não, eu não sou tão idiota assim. – ela se mostrou falsamente ofendida.
– Mas como? – perguntei, ainda sem acreditar estar conversando com uma pessoa morta.
– Eu acho que a pergunta não é “como” e sim “por que”. – Annie me encarou com sarcasmo.
– Por que... – comecei a perguntar feito um idiota, mas ela me interrompeu de imediato.
– Tem um motivo pra eu estar aqui, Bill. – ela começou se aproximando mais de mim – Eu preciso que você me faça um favor.
– Favor. – repeti a palavra sem entender o rumo que a conversa estava tomando – Que tipo de favor?
– Preciso que você faça com que meu assassino tome consciência do que ele me fez. – ela falou rápido, me chocando.
– Que? Mas qual é o objetivo disso? – perguntei me sentando no sofá, pousando a cabeça em minhas mãos, a sentindo doer com tanta informação armazenada numa única noite.
– Eu não quero julgá-lo, nem ao menos condená-lo. Só quero que ele saiba. – ela se sentou do meu lado – Quero deixar o resto com ele próprio. Acho que não existe nada que puna melhor um homem do que ele mesmo.
Ela tinha razão. A culpa de um ser humano pode ser uma das piores punições do universo. Pelo menos em minha opinião isso contava.
– Você sabe quem a matou? – indaguei levantando a cabeça para encará-la.
– Sei. – quando ela confirmou seu rosto pareceu ficar rígido, perdendo toda a tristeza, mas logo sua expressão se relaxou, e ela continuou – Já está tarde. Você precisa dormir. Amanhã continuamos essa conversa.
– Mas... – tentei protestar, mas ela estava certa. Minhas pálpebras pesavam, tentadas a serem fechadas. E minha cabeça latejava, pedindo por descanso.
– Está bem. – concordei.
Levantei-me do sofá num pulo e fui pro meu quarto, sendo seguido por Annie.
Troquei de roupa mesmo com ela ali, parecia uma coisa normal, mesmo eu tendo me lembrado a pouco tempo de tê-la amado uma vida toda.
Meti-me de baixo do edredom na cama e Annie se sentou na beirada da mesma.
– Bill. – ela me chamou aos sussurros quando eu já tinha fechado os olhos.
– Sim? – murmurei forçando meus olhos a se abrirem.
– Você não pode me tocar. – ela falou sorrindo e continuou num tom mais debochado – Mas eu posso tocar você.
Annie se abaixou e tocou meu rosto com os lábios avermelhados. O beijo foi como uma brisa fina de inverno, mas me fez cair num sono tranqüilo e profundo. Embora parecesse impossível dormir com o turbilhão de pensamentos que rodeavam minha cabeça naquele mesmo instante. Eu não sabia como eu poderia ter esquecido algo assim. Como ela havia morrido e se eu havia sentido dor na época de sua morte. O que acontecerá para tudo ser apagado, como uma borracha apaga um texto mal feito e torto de um autor.

Postado por: Grasiele

Smooth Criminal - Capítulo 1 - Remember The Time


Um grito...

Um tiro...

O alvo errado...

O corpo caindo ao chão.


Meu despertador tocou às 10h e 30min, como sempre.

Acordei assustado com o bip irritante, mas intimamente eu estava até aliviado por todo aquele sangue sendo derramado ao chão ter feito parte apenas de um sonho.

Bati a mão no despertador, fazendo o bip – que já estava invadindo meu cérebro – parar finalmente.

Um pesadelo, isso sim!

Levantei-me devagar. Embora eu estivesse um tanto atrasado – o que não fugia da minha rotina –, eu não tinha nem um pingo de vocação para ser um homem comprometido com seu trabalho e apressado a começar o mesmo. Eles é que me esperassem para o ensaio da banda, ou que começassem sem mim, se fosse do desejo deles.

Fui até o banheiro, meti a cabeça debaixo da torneira da pia, pra acordar mais rápido - o que não foi uma missão muito bem sucedida. Eu ainda parecia estar dormindo.

Meu estomago pedia para ser abastecido. Arrastei-me em direção a cozinha.

Abri a geladeira desanimadamente.

– Ah! Droga... – gemi ao encontrar apenas uma caixa de leite vencido, solitária no fundo da geladeira totalmente vazia.

Pouco me importo com a data de validade de qualquer coisa!

Peguei a caixa de leite e o tomei, quase em um só gole. Até que o gosto estava agradável.

Fechei a geladeira. O calendário pregado de qualquer jeito a porta indicava dia 16 de agosto, um glorioso domingo.

Dia de folga! Ótimo. Hora de voltar pra cama!

Fui aos pulos pro meu quarto, e me joguei na cama, me colocando de volta para baixo das cobertas. Suspirei aliviado por ter a chance de mais algumas horas de descanso.

Oh, mein Gott, não deixe que eu desperdice essa chance!

Remexi-me na cama, tentando voltar a dormir... Em vão.

O sol, já forte àquela hora, entrava pela janela – a qual eu ainda não tivera coragem pra comprar cortinas – e queimava sobre minhas pálpebras. Sem contar os roncos do meu estomago, que fazia questão de deixar claro que estava vazio.

Levante-me, revoltado, e coloquei uma calça jeans velha qualquer, uma camiseta de alguma banda - da qual eu nem vi o nome. Acho que era Placebo. Ou talvez não. Não me importa! Calcei meu tênis, coloquei uma blusa com um capuz enorme, óculos escuros gigantescos e me dirigi ao supermercado mais próximo.

Foi uma dificuldade enorme me lembrar onde estavam as chaves do carro. Mas as encontrei, por fim, dentro do pote vazio de biscoitos. Agora eu já estava dentro da confortável BMW cinza.

Parei no estacionamento do supermercado. Coloquei o capuz da blusa de moletom, e desci.

Pra minha sorte, lá dentro não estava cheio, e por isso não fui notado ou abordado por algum fã descontrolado.

Joguei umas besteiras no carrinho de compras e segui para o caixa.

Embora não houvesse quase ninguém ali, eu jurei sentir estar sendo seguido por alguém. Uma mulher, mais precisamente. Eu vi seu reflexo na porta da geladeira do supermercado, enquanto eu a abria para pegar um sorvete. Mas ela sumiu, tão rápido quanto apareceu. Só que essa não parecia ser sua primeira e ultima aparição, e logo isso se confirmou pra mim.

Dirigi para casa o mais rápido que eu consegui. Meu maior desejo naquele momento era me jogar no sofá e me entupir de besteiras calóricas enquanto eu via alguma idiotice na televisão.

Quando eu estacionei na garagem do prédio, a segunda aparição da bela mulher se realizou. Soltei um grito de susto quando meus olhos bateram de encontro com os olhos verdes refletidos no retrovisor do carro. Virei-me para o banco traseiro, mas ela não estava mais lá.

– Argh! - bufei irritado com aquela brincadeira idiota.

Com certeza eu não tive uma noite de sono boa, e agora meu consciente me pregava peças reclamando por isso.

Peguei o elevador segurando as sacolas de compras e fui pro meu apartamento.

Eu estava sentado no sofá assistindo qualquer besteira na televisão, quando o terceiro capitulo da perseguição se deu inicio.

Senti um vento frio em meu pescoço e me virei de susto. Deparei-me novamente com os olhos verdes me encarando.

Dessa vez eu pude notar cada belo detalhe da mulher dos olhos de esmeralda. Seu cabelo ruivo caia ondulado pelos seus ombros a mostra pelo vestido de estampa florida. A boca rosada estava dobrada em um meio sorriso encantador e até um tanto infantil, contracenando com seu corpo de curvas definidas.

– Te assustei? – a voz dela me suou como sinos bem afinados.

Eu não sabia o que responder. Sim, ela havia mesmo me assustado, mas era duro admitir isso.

A ruiva continuava a me encarar. O rosto a centímetros do meu. Sua respiração gelada – quase cadavérica – se chocando com a minha, quente e descontrolada.

– Er... Quem é você? – consegui pronunciar as palavras, mesmo que ainda tremulas e sem demonstrar firmeza alguma no tom de voz.

– Não se lembra... – ela observou, parecendo desapontada.

A mulher se debruçou mais para frente, agora nossos rostos estavam quase se tocando. Eu queria impedi-la, mas meu corpo não obedecia a nenhum comando do meu cérebro.

– Você tem que se lembrar... – ela sussurrou e em seguida me beijou, um beijo doce e congelante.

Então, em um simples beijo, minhas lembranças da bela ruiva vieram à tona, junto com uma escuridão interminável.

Abri os olhos sentindo minha cabeça girar. Já era noite e eu ainda estava no sofá da sala com a televisão ligada no mesmo canal.

Havia sido um sonho? Não. Era muito real pra isso, e minha mente não é tão brilhante assim.

Olhei em volta e a avistei, parada, olhando as estrelas pelo vidro da janela, e então, tive a confirmação da realidade.

– Você se lembra agora? – ela perguntou com a voz chorosa, sem tirar os olhos das estrelas.

– Sim... – sussurrei, com a voz mais firme, certo do que eu dizia – Annie!

Postado por: Grasiele

Smooth Criminal

Smooth Criminal
"Um grito...
Um tiro...
O alvo errado...
Um corpo caindo ao chão.
Então, em um simples beijo, minhas lembranças da bela ruiva vieram à tona, junto com uma escuridão interminável."

Classificação: +18
Categorias: Tokio Hotel
Personagens: Bill Kaulitz
Gêneros: Ação, Darkfic, Drama, Fantasia, Mistério, Romance, Suspense, Tragédia
Avisos: Heterossexualidade
Capítulos: 7
Autora: S- BK

Taxi - Capítulo 7 - Vida Nova


Marianne Marchi

Eu havia perdido Bill naquele instante. Eu o vi me dar às costas assim como eu fiz com ele.
Nunca imaginei que eu tivesse o feito sofrer tanto. Quando o beijei naquela noite, tive medo de enganá-lo ainda mais, mais do que eu já havia enganado. Fiquei com medo de ter confundido todos os sentimentos presentes em mim. E minha única saída foi ter voltado com Alex.
Mas assim que o beijei, tive nojo de mim mesma, e eu percebi o quanto eu amava Bill. Mas percebi tarde demais. Eu deveria ter escutado a primeira mensagem e ter ido atrás dele, e não tê-lo ignorado.
Eu chorei tanto quando ele disse que nunca mais me ligaria. Tentei voltar a amar Alex, mas obviamente não consegui. O loiro era indiferente para mim, eu só queria Bill.
Mas agora eu não tenho nenhum dos dois. Nem o que eu odeio e nem o que eu amo com todo o meu coração.
Vi as portas se fecharem e peguei um táxi até meu apartamento.
Bill, obviamente, encontraria uma europeia melhor do que eu. Uma inglesa completamente elegante e gentil, que nunca o faria sofrer.
Ele merece ser o homem mais feliz do mundo, e por mais que eu esteja triste, nada vai importar, afinal, o homem que eu amo vai estar feliz.
Pelo menos era para ser dessa forma. Eu teria que ficar feliz por ele, mesmo querendo acabar com qualquer fulaninha que resolvesse se envolver com Bill.
Voltei para casa lamentando-me por ser completamente fraca e estúpida. Bati a porta forte e me odiei por nunca tê-lo beijado em minha sala de estar. Pelo menos eu teria boas lembranças.
Passei meu olhar mais uma vez pela sala vazia. Aquilo lá já não tinha graça sem ele.
Sequei minhas lágrimas e me deitei no sofá depois de apertar a secretária eletrônica.
– Você possui duas novas mensagens. Primeira nova mensagem: Oi, é a Marianne, certamente não estou em casa, então deixe seu recado, beijinhos... Mary, é a mamãe, quando você chegar me ligue, consegui aquela receita daquele bolo de chocolate que você queria. Até mais, amo você.” – o pip ecoou pela sala invadida pelo sol – Segunda nova mensagem: “Oi, é a Marianne, certamente não estou em casa, então deixe seu recado, beijinhos... Mary? – olhei para o telefone Mary, sou eu. - me sentei rápido no sofá não acreditando– Eu sinto muito. – arrepios passavam pela minha nuca, era ele. – Estou sentado na poltrona e eu nem consegui dizer que eu também te amo. – pausa – Você chegou tão de repente, eu nunca imaginei te ver outra vez. Eu não sabia o que fazer, e agora eu não paro de pensar em quantas coisas eu queria te falar. – sua voz está embargada - E eu sei que você faria valer a pena se eu continuasse aqui. – há um silêncio – Eu me sinto péssimo por não ter te dito que te desculpo, porque eu também errei quando não disse o que sentia por você. – coloco a mão na boca para os soluços não atrapalharem a mensagem – Eu sou apaixonado por você e queria poder sair desse avião agora pra sentir o seu cheiro. – ele respira fundo e eu também.
– Porque você não sai? – choro segurando o telefone nas mãos – Me perdoa...
O que eu estou fazendo?
Você precisa desligar, vamos dar início ao voo. – ouço alguém pedir atrás da voz de Bill.
Não! – ele fala abruptamente e não consigo escutar mais nada por algum tempo. Não?, penso com a respiração já ofegante – Eu preciso sair!
Fico ereta e meus olhos crescem.
– O que? – grito, histérica.
Você precisa sentar! – pede outra vez.
Eu quero sair, eu preciso sair desse avião!
Se sente, por favor!
Não! – grita.
Eu estava parada em pé com o telefone em mãos, sem reação.
Senhor, o avião vai decolar, se sente, por favor.
Não dá! – ele repetia sem parar.
Sente-se!
– Não! – gritei junto a Bill. – O deixe sair do avião!
Sente-se, por favor!
– Você não entende, eu preciso sair!
– O avião está prestes a decolar, é para sua segurança, sente-se!
Não! Deixe ele sair! Deixa o Bill sair!
– Eu amo alg...
Escuto o pip encerrando a ligação.
Nenhuma nova mensagem.
– O que? Como é? Não! – seguro firme o telefone com as duas mãos. Estava apavorada - Ele saiu do avião? – gritei para o telefone – Meu Deus, ele conseguiu sair? Ele saiu...?
– Eu saí do avião. – escutei uma voz atrás de mim e me virei rápido.
Lá estava ele com a cópia de minha chave nas mãos.
– Bill! – sorri e fui até o seu encontro – Eu te dou o céu, a lua, meu coração, eu te dou tudo!
Ele sorriu de canto e me olhou.
– Eu só quero você. – se aproximou e me envolveu no melhor beijo de minha vida.

Bill Kaulitz

Depois de fazer o melhor sexo da história, Marianne pediu transferência de universidade e fomos morar juntos em Londres. Estou em um emprego ótimo em um dos jornais mais importantes da Europa, enquanto ela está terminando a faculdade de cinema.
Gustav, Tom e Georg vão vir no próximo fim de semana para nos visitar. Disseram que estão loucos para fazer uma daquelas reuniões que fazíamos antigamente, mas que dessa vez ia ser diferente já que o apartamento seria maior. Bem maior.
Estou terminando de me arrumar para encontrar Mary perto da Tower Clock. Hoje vamos comemorar o sucesso da minha nova coluna no jornal. Ela disse que precisava fazer algo antes de jantar comigo e pediu para só encontrá-la lá.
Junto à carteira de cigarros e meu celular da bancada, coloco-os no bolso e pego o carro rumo ao Big Ben. Quando chego, estaciono em uma das ruelas e disco seu número.
– Onde você está? – pergunto olhando para os lados e saindo do carro.
Já estou chegando, estou te vendo. Não se mova! – solta uma risada e desliga.
A rua está um caos. É sexta-feira e os restaurantes estão lotados, fiz reserva em um dos melhores da cidade. O que ela sempre passa em frente e diz que seria ótimo um dia nós dois irmos jantar lá.
Ligo o alarme do carro e passo os olhos pela rua. Um táxi amarelo pára do outro lado da calçada e eu forço os olhos.
Como se estivesse voltando ao passado: vejo Marianne sair de lá com um embrulho em mãos. Com a saia escura mostrando suas pernas e um sorriso lindo no rosto.
Entretanto, como em um jogo de ironia da vida, a mulher que caminha sedutoramente, como uma estátua do céu, pela rua, está vindo em minha direção e não irá desviar.
– Você está linda! – digo assim que ela me abraça.
– E você está fantástico! – sussurra depois de me dar um beijo – Te trouxe um presente!
Olho o embrulho em suas mãos e franzo a testa.
– O que é?
– Não encontrei as trufas do Phill’s por aqui. – ergue os ombros como lamentação – E nem queria, na verdade. Estive pensando: porque não renovar meus mimos para ele? – curva uma das sobrancelhas – E então encontrei os cup cakes da Stacy! – sorri animada e vitoriosa.
Solto uma risada pegando o embrulho de suas mãos. Olho-a e a envolvo em um abraço.
– Você é a mulher da minha vida. – falo ainda a olhando.
Mary joga a cabeça para um lado e depois me olha com um sorriso maroto no rosto.
– Eu sei disso. – pisca e me beija.
Quando a vida lhe dá oportunidade de enriquecê-la com um amor, não ignore. A oportunidade pode se tornar sua salvação, não para todos os seus problemas, mas para o seu coração.
Marianne se tornou minha salvação. De todos os jeitos.

Postado por: Grasiele | Fonte

Taxi - Capítulo 6 - Voo 4567


Eu conheço uma menina
Que põe cor dentro do meu mundo
Mas é como um labirinto
Onde todas as paredes mudam continuamente
Eu fiz tudo que eu posso
Para seguir as etapas com meu coração em minhas mãos
Agora eu estou começando ver
Talvez não tenha nada a ver comigo






Fiquei a noite inteira pensando se aquilo valia a pena, de um lado eu ainda tinha esperanças de que Marianne surgisse de algum lugar, mas de outro eu tinha certeza que isso não ia acontecer.


Fiz minha matrícula para ver se eu acordava logo e saia daquele sufoco. Empacotei minhas coisas e tive minha última festa no meu apartamento com Georg, Tom e Gustav.
– Prometo que é a última vez que ligo. Depois disso vou apagar seu número dos contatos e vou te deixar em paz. – respirei forte – Ganhei uma bolsa de estudos. Vou me mudar amanhã... Eu só não queria ir embora sem saber do porque que ainda não estamos juntos. Eu não queria dizer isso, mas eu ainda te amo, e acho que vou estar sempre aqui... Infelizmente.
Bati o telefone no gancho e me acabei de chorar como uma adolescente em crise.
No dia seguinte Sr. Sean me parabenizou e me chamou de “feijón” pela última vez. Comprei uma trufa de morango no Phill’s e fui para casa. Terminei de arrumar as malas e olhei pela janela com a esperança de vê-la descendo a rua, mas nada. Era inútil isso, Marianne mal sabia o que acontecia comigo. Ela pouco ligava para mim.
Peguei um táxi e fui ao aeroporto. Assim que larguei as malas na esteira, a chamada para o voo foi feita. Tom, Georg e Gustav haviam dito que não iriam aparecer no dia.
Tom disse que não queria chorar a terceira vez na sua vida.
Gustav não pode porque sua irmã estava doente.
Georg inventou alguma desculpa ridícula pra não se passar por um cara com sentimentos.
Mas eu os agradeci, mentalmente, mas agradeci. Não queria dar adeus a ninguém. Minha cota de lágrimas já deveria ter se encerrado há muito tempo...
– Objetos ali, por favor. – falou a segurança da primeira entrada apontando para mesa.
Tirei o que estava em meu bolso. Mas assim que ia os depositar onde a segurança havia pedido, meu celular começa a vibrar.
Olhei para os lados, aflito, mas ninguém estava se importando.
– Alô? – atendo com presa.
Bill. – sussurrou.
– Quem é? – engoli em seco.
O que você está fazendo? – sua voz estava embargada.
– Não! O que você está fazendo? – me encostei na parede, agitado. – Porque está me ligando?
Eu escutei todas as suas mensagens na secretária. Eu não quero que você me deixe em paz.
– É tarde demais agora, eu estou prestes a embarcar... – lamentei, encostando minha cabeça na parede.
Eu sei disso. –soluçou – Eu estou muito feliz por você, Bill. Mas estou triste por nós.
– Por nós? – minha voz estava fraca, eu esperei por muito tempo aquele momento – Você me fez acreditar que não existia nós, Marianne.
Mas existe, eu fui uma idiota... – soluçou outra vez.
– Como é? – alterei a voz, olhando pros lados em seguida. – Você ficou comigo aquela noite e sumiu! Você me usou, e isso soa tão ridículo como o que aconteceu aquele dia!
Eu sei, me desculpe, me desculpe!
Respirei fundo.
– Porque você voltou com ele? Porque me ignorou como se eu não fosse ninguém?
Houve um silêncio.
– Marianne...
Eu fiquei com medo. Achava que ainda o amava, mas então eu vi você lá e...
– Eu passei um ano inteiro apaixonado por você. E você me retribui assim? Você acha que eu não fiquei com medo? Você sabe o que é sofrer durante um ano inteiro por alguém que não está nem ai pra você?
Bill, me desculpe!
– Não, você não sabe o que é! – me desencosto da parede e começo a andar – Todos os dias eu me olhava e me perguntava se ia demorar mais pra tirar você logo da cabeça. Se eu ia conseguir alguém pra te substituir!
Você conseguiu me tirar da cabeça? – perguntou com a voz mais forte – Você conseguiu outra melhor do que eu?
Bufei.
– Não seja ridícula, você sabe que não.
– Eu também não consegui ninguém melhor do que você, Bill.
Voo 4567, para Londres. Embarque no portão 8. – nos interrompeu a chamada para o voo.
– Eu sinto muito... – pigarreei tentando esconder a voz embargada – É tarde demais pra eu saber disso.
Desliguei o telefone e coloquei no bolso. Eu deveria seguir em frente.
Olhei para a segurança, e assenti convicto. Larguei meus pertences na caixa e ergui meus braços para a revista.
– Bill. – escutei alguém me chamar e me virei – Não é tarde. Fica!
Lá estava ela, me olhando com os olhos vermelhos.
No primeiro instante fiquei parado com a segurança nos olhando atenta, mas logo eu dei alguns passos em sua direção.
– O que você faz aqui? – abaixei os braços devagar.
– Eu não quero te perder outra vez. – passou a mão pelos cabelos, nervosa – Eu sei que eu errei, que errei quando disse que te amava e depois te deixei sem dar explicações. – mais algumas lágrimas rolaram – Mas eu estava com medo de magoar alguém igual a você. Você sempre me dizia que eu era incrível. E eu não sabia se eu estava confundindo ou não...
– E você achou melhor sair daquele jeito?
– Para você sentir ódio de mim!
– Você conseguiu. – falei pasmo.
– Você me odeia? – pergunta em um fio de voz e eu continuei calado – Você me odeia, não é? E é tudo culpa minha... Eu tive tanto medo de te enganar, achar que te amava e depois não ser verdade. Se você me odeia eu te entendo.
– Eu não te odeio... – cruzei os braços a contragosto – Eu deixei todas aquelas mensagens, iria te odiar se deixasse aquilo?
Ela nega com a cabeça.
– Pois então... – dei de ombros.
– Me perdoa, Bill? – diminuiu a distância entre nós.
Minha cabeça cai.
Última chamada para o voo 4567.
– É o meu avião. – murmurei e a olhei.
– Bill? – sua respiração ficou pesada – Você, você vai? Eu posso fazer valer a pena... Se, se você quiser o céu, eu te dou ele! – encostou seu rosto no meu.
– Eu não quero o céu. Eu só queria o seu coração. – me afasto – Eu sinto muito, Mary.
Virei de costas e parti para o portão 8. Marianne permaneceu lá, com o brilho ofuscado pelas lágrimas no seu rosto, mas bela como sempre.
Bela como a solução de todos os meus problemas.

Postado por: Grasiele

Taxi - Capítulo 5 - Camisa xadrez


Eu deveria ter falado
Eu deveria ter orgulhosamente reinvidicado
Que minha cabeça está culpada
Por todos erros do meu coração

E tudo está caindo enquanto você vai embora
E está tudo em mim, quando você se vai

Acordei no dia seguinte com uma porta se batendo. Pulei da cama assustado, e Marianne não estava mais ao meu lado. Coloquei uma calça correndo e passei pela sala o mais rápido que pude. Fui no corredor e o elevador já estava chegando ao térreo. Eu não teria como alcançá-la. Marianne havia desistido de mim, havia percebido que havia feito uma grande burrada.
Passei a mão pelo rosto e voltei para dentro do apartamento. Ao que tudo indicava, minha vida medíocre reinava outra vez.
– O que aconteceu? – virei abruptamente para a porta da cozinha, afoito.
O que ela está fazendo aqui?, foi a primeira coisa que me perguntei.
– Mary? – olhei para a porta e depois para ela – Não foi você que saiu...? Quem...?
– Georg. – ela sorriu com certa timidez - Ele foi o último a ir embora e o primeiro a se atrasar para o trabalho.
Minha cabeça se ergueu.
– Droga, o trabalho! Que horas são? – virei para os lados tentando procurar algum relógio – Já devo estar atrasado. Sr. Sean vai me...
– Eu liguei para ele. – me interrompeu e só então percebi o que ela usava minha camisa xadrez que tanto gostava. – Disse que você teve uma viagem de última hora... Assunto familiar.
Eu a olhei com certa admiração. Aquilo não podia ser real, ela era incrível.
– Obrigado. – sorri sem jeito. Parecia que o garoto do primeiro dia havia voltado.
Ela continuou parada na porta da cozinha, enquanto tremia a perna rapidamente. Marianne esperava que eu falasse algo. Eu esperava que Marianne falasse algo.
– Olha... – nós dois falamos juntos. – Pode falar... – pedi.
– Eu queria te contar uma coisa, que eu acabei não falando para você ontem... – torcia a barra de minha camisa – Só não quero que fique bravo comigo, tudo bem?
– Bravo? – cruzei os braços um tanto intrigado – Porque ficaria?
Mary me olhou por alguns segundos e depois desviou o olhar para o chão outra vez.
– Lembra quando disse que havia trocado de restaurante porque Alex havia enjoado da comida? – perguntou, mas continuou sem esperar minha resposta – Então, eu estava mentindo.
Franzi a testa.
– Mentindo? Como mentindo?
– Eu e Alex terminamos há cinco meses. – pigarreou – Mas não foi por causa das traições.
Sentei no braço do sofá, queria saber de mais.
– Eu sabia o quanto Alex me traía, mas eu nunca tinha dito nada porque eu realmente achava que o amava. – tirou a mecha de cabelo que caiu em seu rosto – Quando eu te conheci, eu só pensei que seríamos grandes amigos. – respirou fundo e continuou a fitar o chão - Mas ao longo do tempo, eu fui vendo que não era bem assim... Você falava de todas aquelas garotas e eu tinha que me concentrar para não esbanjar nenhum sentimento. Porque além deu não saber o que eu sentia, eu não sabia o que você sentia! – ela andava de um lado para o outro, batia uma colher na palma da mão – Mas depois de um tempo eu vi que aquele ciúme, que sentia quando imaginava você com outras, era real!
Meus olhos cresceram e eu podia jurar que meu coração também.
Eu te amo. – falou sem me olhar – Mas então teve a história de Alex. Eu tinha medo que quando terminasse com ele, você soubesse.
– E por quê? Não seria melhor se eu soubesse?
– Não do jeito que eu pensava. – encostou-se ao vão da porta – Eu falava de Alex para ver se você sentia ciúmes, mas você nunca sentia. Você me abraçava e dizia que tudo ia ficar bem. Aquilo me matava. Mas eu não conseguia mais ficar com Alex, sabendo de tudo e amando você.
– Eu passei cinco meses inventando histórias pra tentar tirar você da cabeça porque eu achava que você nunca ia largar Alex. E agora você me fala isso?
– Você me amava? – seu tom de voz foi leve.
– Eu amo! – a olhei por algum tempo e depois desviei o olhar.
– Eu sei que eu fiz besteira, Bill. Mas você também errou quando não me disse que ele me traía.
– Como você sabe que eu sabia? – perguntei aflito.
– Vi algumas vezes você almoçando no Marcy’s e vendo Alex e a atendente da sorveteria juntos. Porque nunca me contou? Ia facilitar as coisas.
– Mas você já sabia... – engulo em seco – E eu sempre detestei ver você chorar por causa daquele cara! Não queria ver você chorar mais ainda.
– Ou não queria que eu não fosse mais a papelaria te ver? – falou em um tom agressivo e eu me calei – Você achou que eu estava indo até lá por causa de Alex, mas você errou. Errou feio, Bill. Eu só ia lá por causa de você!
– Por causa de mim? – minha voz saiu em um fio ridículo.
– Você era o único que eu conseguia conversar sem me lembrar das coisas que Alex fazia. – dá de ombros – Você foi a solução de todos os meus problemas.
– Porque você não terminou com Alex antes?
– Eu tinha medo. Não sabia se eu o amava ou amava você. Não queria enganar ninguém...
– Mas você enganou, Mary. – andei até sua frente.
O silêncio estava cada vez pior. Eu me sentia estranho quanto a tudo.
Marianne tinha a cabeça baixa enquanto eu a fitava. Ela soltou uma risada abafada e me olhou. Seus olhos estavam brilhando pelas futuras lágrimas.
– A gente nunca vai dar certo, não é? – franzi a testa pedindo uma explicação – Olha só, mal começamos e já estamos discutindo, Bill.
– Mas é assim... – murmurei – Os casais discutem e depois fazem as pazes. – segurei em seus braços.
– Não antes de começarem algo. – passou a mão pela bochecha e se livrou das minhas mãos – Eu preciso ir trabalhar.
Sem dizer mais nada, ela me contornou e se fechou em meu quarto.
Sentei no sofá. Eu não sabia o que estava acontecendo e nem o que eu estava pensando. Não demorou muito e Marianne apareceu agitada na sala. Ela se abaixou e me dei um beijo no rosto.
– Não vamos forçar algo que não vai dar certo. – a olhei, Mary tinha os olhos marejados.
– Fica. – segurei em sua mão. Eu estava improvisando, como todas às vezes. – Quem disse que não vai dar certo, Mary? - me ergui e encostei minha testa na sua. - Nós queremos que dê certo...
– Eu preciso ir. – ela se afastou e me olhou como se dissesse adeus – Até.
– Mary... – a chamei quando ela já havia saído.
Demorei duas semanas para procurá-la. E quando eu a encontrei tive a pior decepção da minha vida. Eu estava indo até o Marcy’s quando eu a vi abraçando Alex, meu coração apertou e, por um instante, achei que não poderia ser verdade, mas logo ela me fitou e virou o rosto.
Marianne voltou a ser a garota do táxi amarelo, voltou a ser de Alex, mas, daquela vez, não a que eu queria. Pelo menos, não naquele instante em que o maço de cigarros batia na calçada e a via com aquele cara totalmente ridículo.
Voltei para a casa e destruí a camisa xadrez que ela vestiu quando ficou junto comigo. Doei as roupas de cama e depois eu bebi. Bebi até não poder mais e dormi deitado no meio da sala de estar.
Dramático como sempre.
Não a vi mais depois daquilo. Mas eu ainda tinha uma esperança suicida dentro de mim, uma esperança inútil de que ela só estava fazendo aquilo para me provocar. Liguei para sua casa durante um mês inteiro e sempre caía na caixa postal.
– Qual é o seu problema? Hãn? Quer dividir Alex com mais quantas garotas? Mais o mundo? – gritei na primeira ligação – Não, quer saber? Vocês dois se merecem! Você é uma pilantra!
– Mary? Eu não queria ter dito aquilo... Eu só não entendo o que aconteceu aquele dia... Porque você não me ligou depois? Porque não conversou comigo?
– Atenda! Eu sinto a sua falta.
– Não estou entendo porque você está me evitando, eu não estou entendendo nada depois do que aconteceu aquele dia.
– Já se passou dois meses e nada de você retornar. Acho que é hora de eu parar de insistir em algo que você não quer, não é?
Me sentia um estúpido, mas eu queria a namorada do Alex pra mim. Marianne era incrível, e eu sempre me perguntava onde eu poderia arranjar uma mulher igual a ela. E nunca tinha respostas.
Eu ia ao Marcy’s e ficava olhando todos os táxis amarelos e nada dela. Ficava na banca de revistas e ao invés de folhear alguma coisa, eu procurava por ela ao redor. Eu voltava do trabalho e ficava de plantão ao lado do telefone sempre imaginando uma nova mensagem para a sua secretária eletrônica.
Minhas notas na faculdade foram às alturas, eu me afundava em livros pra tentar entender o que estava acontecendo nas matérias, já que eu não fazia ideia do que estava acontecendo com a minha própria vida. Entender alguma coisa era uma saída do sufoco da dúvida.
Depois de um tempo eu comecei a ter raiva de tudo. Marianne estava pouco ligando e eu sofria cada vez mais. Mais e mais. Sofri desde o início e a única coisa que ela fez foi ter me dado esperanças falsas.
Esperanças imbecis.
Faltava uma semana para o curso terminar quando eu recebi uma bolsa de estudos na Inglaterra para uma pós-graduação. Eu havia feito uma prova só por fazer e eu realmente me surpreendi quando fiquei sabendo da aprovação. Tinha dois dias para fazer a matrícula, caso contrário eu perdia a bolsa.

Postado por: Grasiele

Taxi - Capítulo 4 - Gente, essa é a Mary


– É a pizza? – Tom gritou da sala e Marianne esticou o pescoço para tentar ver de quem era a voz.
– Estou te incomodando? – perguntou preocupada enquanto eu balançava a mão nas costas para nenhum dos garotos chegarem perto.
– Não, não está... – pigarreei – Os meus amigos estão aqui. Você quer entrar?
Gaguejou e depois me olhou como quem mantinha um segredo.
– Sobre o que você queria falar? – tentei arrancar alguma coisa dela. Marianne parecia confusa demais. – Você está bem?
– Sim! – falou de súbito – Era sobre Alex.
– Ele aprontou alguma? – estreitei os olhos, já bravo. Mas logo ela negou com a cabeça. – Ótimo. Não quer entrar? Eles parecem loucos, mas são realmente legais. – dei um sorriso para ela.
Marianne espiou pelo meu ombro e depois me deu um beijo no rosto.
– Se eu não incomodar...
Abri passagem para ela que passou um tanto cautelosa. A sala, que antes estava agitada, ficou em um silêncio constrangedor.
– Gente, essa é minha amiga, - pigarreei – Marianne.
Todos olharam para ela com olhos de que sabiam o que ela representava para mim. Ninguém falou nada durante dois minutos e tudo pareceu ficar mais patético do que meu sentimento. Bebi um grande gole da cerveja que segurava e fui para a cozinha rápido.
Assim que dei as costas, escutei Georg se manifestando e Gustav vindo atrás de mim.
– Cara, essa é a garota do táxi amarelo? – me perguntava abestado enquanto eu abria a geladeira e pegava mais algumas bebidas - É ela?
Concordei e bebi mais um pouco.
– Por quê? – o olhei com receio.
– Ela é maravilhosa! – exclamou em um sussurro – Você disse que ela era bonita, mas não tanto... – pausou – Porque você nervoso?
– Não nervoso. – passei a mão pela boca. – Só estranho.
Gustav ergueu os ombros como quem não havia entendido.
Meus mundos estavam se misturando e era Marianne que os conectava. Só que eu sempre havia imaginado que quando se conectassem seria através de algo ruim, e com ela ali, parecia que tudo corria bem como eu nunca planejaria.
Gustav me deu um soco rápido e fez um sinal para a porta da cozinha.
– Bill... – escutei a voz dela me chamar e me virei rápido – Eu posso usar o telefone?
Assenti meio perdido e sai da cozinha junto de Gustav. O telefone ficava lá, e ela sempre fazia essa pergunta se quisesse falar com alguém a sós. Caso contrário, usaria sem nem pedir.
Cheguei na sala e lá estava Tom e Georg me olhando com segundas intenções. Dei um sorriso débil e eles soltaram uma risada como dois adolescentes problemáticos.
– Riem baixo! – falei – Vocês são uns otários. – completei rindo e me sentando no sofá.
– Gostosa! – foi o que Tom disse quando se inclinou para mim – E gata... Onde você a encontrou mesmo?
– Cala a boca. – dei um tapa em seu boné meio abobado – O que vocês acharam dela? Não falaram nada demais, não é?
Georg balançou a cabeça.
– Ela ficou só um pouco envergonhada porque o Tom não fechava a boca para olhar as pernas dela... – ele riu abertamente.
Lancei um olhar de desaprovação a Tom que só deu um sorriso ridículo.
– Ela não é gata demais? – Gustav disse animado – Quando o Bill falava dela, achava que era como as outras...
– O que tem de errado com as outras? – alterei a voz.
– Qual é Bill, nem venha... As suas outras garotas eram... – Tom coçou a cabeça e fez uma careta.
Marianne não é minha garota. – os olhei e eles ficaram quietos – Ela é a garota do Alex...
Ficou um silêncio e pude notar que eles trocavam olhares entre si.
– Não estão com fome? – nós quatro demos um pulo coletivo quando escutamos a voz dela perguntar – Não querem uma pizza?
– Já pedimos. – falei abruptamente – Ela deve estar chegando...
– Gosta de quatro queijos? – Gustav perguntou.
Ela assentiu.
– Quer alguma coisa pra tomar? – perguntei me levantando rápido – Tem vinho se você não gostar de cerveja...
Marianne olhou para os meninos, que se viraram rápido para a televisão ligada, e veio em minha direção. Engoli em seco e senti os pêlos de minha nuca se arrepiar.
– Eu gosto de cerveja. – disse com a voz mansa, sorriu de canto e pegou a garrafa de minhas mãos, ainda mantendo um contato visual – Porque eu não gostaria?
– Você não parece gostar de bebidas assim... – respondi fraco.
Ela sorriu mais uma vez e bebeu do bico.
Tem coisas que você não sabe sobre mim.
Marianne me olhava fundo nos olhos. Eu podia jurar que se continuássemos mais dez segundos daquela forma, eu a beijaria sem pensar.
– A pizza chegou! – gritou Gustav hiperativo. E eu virei rápido. Eu estava prestes a fazer uma besteira das grandes. Ela era de Alex. A garota de Alex.
Fui até meu quarto, um tanto perturbado, e peguei o dinheiro do criado mudo. Paguei a pizza e servi. A noite andou calma e divertida. Marianne era incrível e os garotos a adoraram tanto quanto eu.
Já era tarde da noite quando ela me puxou para o canto da cozinha.
– Eu preciso te falar uma coisa... – mordeu o lábio, estava nervosa – Podemos conversar?
Olhei para os lados. Os meninos estavam rindo e cheirando a álcool, entretidos demais para se importarem com algo.
– Certo. – concordei meio vago – Tudo bem se conversarmos em meu quarto?
Marianne deu de ombros e me seguiu. Eu sentia seu cheiro de inocência e sedução dançar pelas minhas narinas. Eu a queria para mim.
Sentei na cama e continuei bebendo a garrafa de cerveja que segurava.
– O que foi? – perguntei a olhando fechar a porta.
Ela se balançou para os lados.
– Erm... – passou a mão pelo pescoço, nervosa, e fitou o rodapé - Eu descobri uma coisa há algum tempo... – pigarreou e alisou o vestido – Eu queria te contar, mas não sabia como. – se sentou com cautela na outra ponta da cama – Não sabia como você iria reagir.
– Reagir a que? – bebi mais um gole da cerveja – Aconteceu alguma coisa grave?
Ela me olhou com intensidade e logo abaixou os olhos. Respirou fundo e se sentou mais perto, encostando seu corpo no meu.
Mary? – engoli em seco.
Shiu. – colocou o dedo na frente de minha boca e aproximou seu rosto do meu – Eu queria fazer isso há algum tempo, Bill. Só me faltou coragem...
Minha respiração era pesada. Eu não sabia se eu estava delirando por causa da bebida, ou a bebida estava delirando por causa de mim.
Coragem para...? – foi então que Marianne encostou seus lábios nos meus, delicadamente. Os olhos dela se fecharam, mas os meus continuaram abertos.
Nossas bocas começaram a se movimentar em um ritmo cardíaco louco. Derrubei a garrafa que segurava e deitei Marianne na cama. As roupas pediam para saírem de nossos corpos e minhas mãos pediam para acariciar suas pernas.
Mary, Mary... – a chamei ofegante no meio de um beijo – Você quer fazer isso?
Olhamo-nos por um intervalo de tempo e ela assentiu lentamente.
– Ao contrário do que você pensa, eu não vou me arrepender disso, Bill. Jamais. – passou os dedos pela minha nuca e, calmamente, retornamos ao início de um fim de um romance platônico.

Postado por: Grasiele

Taxi - Capítulo 3 - Apenas uma garota do interior...


Tinha uma menina nova na cidade
Ela tinha tudo decidido
Bom, eu vou dizer algo imprudente
Ela tinha o mais maravilhoso... sorriso

Meus olhos cresceram rápido e minha mão saiu de baixo da sua como um choque elétrico.
– Ai, você tem namorada! – ela exclamou corando – Mas não se preocupe... Como amigos! Eu tenho um namorado também. Ontem você foi simpático comigo e você parece ser legal para se tornar um amigo. Eu não quis te deixar envergonhado com a minha ousadia... Não precisa aceitar se quiser.
– Não. – falei sem pensar. Eu não fazia ideia de como eu havia conseguido aquilo – Tudo bem. – concordei lentamente – Mas meu expediente vai terminar só as quatro...
– Certo. – ficou ereta e animada – Eu posso te esperar.
– Até as quatro?! – minha voz saiu fina de surpresa.
– Se você não se importar... – seus lábios moldaram um sorriso inocente. Eu nunca poderia dizer não para ela.
– Não me importo.
– Ótimo. – falou pegando a tesoura do balcão e colocando em sua bolsa – Vou ver algumas lojas aos arredores, volto daqui à uma hora, tudo bem?
Assenti rapidamente e a vi sumir.
Marianne sumiu e eu sorri.
Balancei a cabeça algumas vezes tentando ver se eu não estava tendo mais um sonho idiota. Apoiei-me no balcão um pouco tonto, o que estava realmente acontecendo?
A uma hora seguinte foi a mais comprida de toda a minha vida. Eu nunca esperaria vê-la outra vez, nunca pensei que poderia saber seu nome ou que teria a chance de tomar um sorvete com ela, com Marianne.
Jogava um jogo de cartas no computador quando ela voltou e me assustou com uma fragrância completamente viciante de flores de laranjeiras, a mesma da tarde passada.
– Se divertindo muito? – seus olhos apareceram curiosos atrás da máquina.
Os fitei e sorri sem jeito. Aquilo era um sonho, só podia.
– Não muito na verdade, não consigo achar o Ás de espada.
Ela andou rápido para o meu lado.
– Posso? – perguntou ameaçando pegar no mouse.
– Onde estar meus bolinhos de aros? – eu saltei e ela saltou de susto. Sr. Sean gritava de dentro da salinha. Marianne contornou o balcão rápido e fingiu olhar algumas canetas em gel.
– Dentro do forno! – gritei de volta e a olhei. Se ela estava ali ou se era real eu não fazia ideia, só sabia que tudo aquilo me fazia sorrir e esquecer como a minha vida podia ser medíocre.
– Se eu te incomodar, por favor, me fale. – ela sussurrou e ergueu os seus olhos grandes para mim. Eu assenti lentamente, perdido em sua delicadeza. – Você é daqui?
Levei algum tempo para perceber que ela me perguntava algo.
– Não, sou do sul de Detroit. – respondi fechando a janela do jogo de cartas – E você?
– Sou do interior. – largou as canetas em gel dentro do copo de vidro – Faz tempo que mora por aqui?
– Três anos e meio. – passei a língua pelos lábios – E você?
– Dois. – jogou os cabelos para trás – Vim por causa da faculdade.
– Faculdade do que?
Marianne era filha única. Os pais eram donos de uma floricultura muito conhecida em County, na Florida, com isso tinham dinheiro suficiente para manter a filha em um belo apartamento em Manhattan e pagar a faculdade de cinema.
O nome do homem loiro era Alex, começaram a namorar dois meses depois que Marianne se mudou. Eram colegas de faculdade. A garota do táxi amarelo tinha poucas amizades na cidade, o que a levou me convidar para tomar um belo sorvete na esquina. Disse que sempre me via indo ao Marcy’s e que minha feição sempre era de simpatia. O que eu estranhei um pouco, já que Sr. Sean tinha a mania de lembrar sempre que com a cara que eu vou trabalhar a papelaria iria à falência por ser confundida com um clube do horror.
Começamos a nos ver toda a semana, ela aparecia depois do almoço e eu sempre torcia para que ela nunca visse Alex junto da atendente. Se ela descobrisse eu nunca mais a veria. Ela esperava até o fim do meu expediente para tomarmos sorvete, quando chegou o inverno começamos a ir à cafeteria do outro lado da praça central. Com ela meus dias ficavam mais fáceis e eu não me importava mais do Sr. Sean me chamar de “feijón”.
Depois de um tempo ela começou a me levar trufas do Phill’s, a primeira eu demorei a comer. Levei para casa e fiquei a olhando por algum tempo. Comi e guardei o embrulho na gaveta da minha escrivaninha. Mas foi algo como: coloquei o papel ali, mas não quer dizer que vou guardá-lo só porque foi a primeira que ela me deu... Pensando dessa forma eu não me sentia uma mocinha, mas era claro que eu havia guardado só por ser a trufa que ela havia me dado.
Ela sabia de cada detalhe da minha vida e eu da dela. Marianne trabalhava em um estúdio de gravação e sua faculdade era à noite, igual a minha.
Eu sempre me perguntava se aquilo era verdade ou era só coisa da minha cabeça. Ela era incrível demais para conversar comigo. Ela dizia que minha voz era engraçada, mas do mesmo jeito ela gostava. Nunca parava de me elogiar e isso me matava aos poucos, ela devia estar comigo e não com aquele cara monstruoso. Ela dizia que meus olhos eram lindos e nunca havia visto nada igual. Isso me fazia pensar nela toda vez que me olhava no espelho.
Teve um dia em que ela apareceu uma hora antes do meu expediente acabar, estava chorando. Falei para Sean que minha mãe havia ganhado bebê e sai com ela. Ela só dizia para eu levá-la para bem longe do centro, dizia que não queria nunca mais pisar ali. Achava que finalmente ela teria descoberto de Alex, mas não, eles apenas discutiram.
A levei para uma praça perto de minha faculdade, ela se deitou no meu colo e pediu para eu acariciar seu cabelo. No início fiquei sem reação, mas logo passei a mão pelos seus cabelos macios. Foi a primeira vez que a vi dormir.
Não a vi mais no horário do almoço. Marianne havia dito que ela e Alex resolveram trocar de restaurante, porque ele não suportava mais a comida de lá. Eu me apaixonava cada vez mais por ela, tentava contornar esse sentimento saindo aos fins de semana e beijando qualquer garota que me olhasse. Eu falava de outras garotas para ela, e sempre tinha conselhos ótimos. Inventava alguma possível namorada para ela sentir ciúmes, mas ela nunca ligava. Marianne sempre me apoiava em tudo e isso me deixava cada vez pior.
Uma vez passei o fim de semana inteiro arrumando meu apartamento para ela ir no dia seguinte me ensinar a fazer arroz sem queimar. Conversamos, rimos e matamos aula sem nos importar com o mundo do lado de fora da parede. Acordamos no outro dia com o celular de Marianne tocando e ela correndo até o ponto de táxi mais próximo para ir trabalhar.
Construímos uma amizade forte. Quer dizer, um romance platônico para mim, uma amizade para ela. De vez em quando Marianne aparecia chorando por ter brigado outra vez com Alex. E eu percebi que se contasse para ela toda a verdade, ela não pararia de me ver, já que havia trocado o restaurante.
Mas eu sempre hesitava. Eu detestava vê-la chorar. Eu contava do meu dia e tentava por um humor nele mesmo sendo a mesma droga de sempre. Ela ria e eu adorava. Nunca iria ter coragem de dizer a ela sobre Alex.
Eu queria a segurar pelos braços e dizer que eu nunca iria fazê-la chorar.
Eu me encantava ainda mais, meus amigos me chamavam de pirado, diziam que eu era louco. Mas assim que conheceram Marianne, se encantaram. Se encantaram no dia em que minha vida, realmente, mudou.
Estávamos em uma reunião de amigos em minha casa, bebíamos e falávamos de mulher quando a campainha tocou. Eu atendi e lá estava ela respirando pesado e aflita.
Marianne. – falei seu nome um pouco perturbado. Eu estava surpreso por vê-la ali. – Aconteceu alguma coisa?
Eu precisava falar com você, Bill. – seu peito subia e descia rápido.

Postado por: Grasiele

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