domingo, 2 de outubro de 2011

Touched By An Angel - Capítulo 6 - Sim! Já estou!

Na quarta feira, aquela droga de despertador não funcionou e como meu pai estava fora da cidade, minha mãe também perdeu a hora.Qual a novidade? Cheguei no hospital uma hora atrasada.  Correndo feito uma louca fui até a recepção e perguntei quase sem fôlego para Lena:
  
- Bill onde está? - Lena sorriu e apenas apontou para o jardim.

Em passos largos cheguei até lá. Ele se encontrava sentado no banco sozinho, de óculos escuros, como SEMPRE, com um fone de ouvido e cantava a música “Em um codinome beija-flor” num sotaque ruim.

No primeiro momento tive vontade de rir, mas, quando sua voz foi entrando em meus ouvidos, foi  me emocionando de tal forma que meus olhos chegaram a ficar marejados; fiquei observando-o e quando a música acabou eu não me contive, bati palmas e disse sorrindo.

- Nossa, o seu sotaque está diminuindo...Tô gostando de ver. Adorei essa nova versão meio "brasileira-alemã". Cazuza ficaria muito orgulhoso.

Ele tirou o fone do ouvido sorrindo e me perguntou:

-O que é segredo de liquidificador? Não sabia que liquidificadores tinham segredos.

Eu ri dele. Bill era simplesmente encantador. Como ele conseguia ser assim tão diferente de tudo o que eu já havia conhecido?

- Bill.. Bill só você mesmo! Isso é uma gíria e quer dizer tipo: Uma língua no ouvido?!

- Língua no ouvido? -Bill levantou uma sombracelha apenas e sorriu incrivelmente sexy.

- Sim, segredo de liquidificadorseria uma troca de carícias.

- Hum... Acho que entendi... digo, mais ou menos... Brasileiro tem mania de colocar tudo no duplo sentido.

- Temos esse vício sim. Isso você tem razão. Bom,vamos para a nossa aula? Vamos na sala de braile hoje, pode ser?

-Olá!

Ao ouvir o Olá, eu me virei e pude ver Eleonora parada com uma cara de songa monga olhando para mim e para Bill. Com uma cara de poucos amigos olhei para ela e disse:

- Ellie? O que esta fazendo aqui? Você não tem estágio hoje no consulado inglês?

Ela se aproximou e deu um beijo na bochecha de Bill e com um sorriso que me irritou profundamente disse:

- Hoje eu não tinha estágio.Vim ver o Bill. Tava com saudade!

A frase dela e o abraço que Bill deu em Eleonora, irritou-me de verdade, veio uma vontade de voar no pescoço dela e tirá-la dali aos tapas. Meu sangue ferveu e meu humor acabou nesse momento.
  
-Posso ficar para aula? Fico quieta e juro que não atrapalho.

-Lógico! Fique adorarei a sua presença. - Bill respondeu animado.

-Então,vamos logo!

Eu disse cortando a conversa dos dois, começamos a aula. Nem preciso dizer que a aula foi uma droga. Os dois sorrindo...quer dizer, a boboca da Eleonora ria feito uma idiota, Bill não podia falar um “a” que ela sorria e jogava a cabeça para trás feito uma oferecida.

Ela estava jogando charme para ele.Só que a tapada acho que havia se esquecido que ele não enxergava. Graças a Deus terminou a aula e estávamos indo para o jardim quando encontramos Gustav no meio do caminho. Ele se aproximou sorrindo e me deu um beijo na  bochecha.

-Oi, Janny?-Ele disse com um ar de galanteador.

-Oi, Gus! – Eu disse sorrindo, não estava empolgada. Pensei que fosse tremer dos pés a cabeça quando o visse depois da nossa ficada na boate, mas sentia-me estranha.

-Olá,  amigão!

Gus abraçou Bill e bateu levemente em suas costas, era nítido o respeito e o carinho que Gustav tinha com o Bill. Com Bill também não era diferente. Ele aceitou o abraço e respondeu:

- E aê, Gustav!

- Você sumiu?- Eu disse olhando para Gustav.

- Era minha folga aqui no hospital! Sentiu minha falta? – Ele perguntou sorrindo.

Aquela pergunta foi constrangedora e juro que minha vontade foi sair dali o mais rápido possível. Senti vergonha por Bill ter escutado aquilo. O que ele ia pensar de mim? Que juízo ele faria de mim?

- Sim! - respondi sorrindo muito sem graça.

- Vamos jantar fora hoje? Posso te pegar depois da faculdade. O que acha?

O silêncio era constrangedor, olhei para Bill e disse:

- Meu pai me colocou de castigo e não posso sair durante a semana. Hoje não vai rolar!

- Podemos ir no sábado? Pra mim não tem problema nenhum. Podemos repetir a nossa noite de sábado.

AFFF!! Era tudo o que eu precisava. Juro que me senti uma menina polegar. Agora, sim Bill ia pensar que eu era uma qualquer. Uma verdadeira profana.  Ainda muito sem graça respondi baixo talvez na tentativa de Bill não me ouvir.

- Tudo bem... Você tem meu telefone, me liga, ok?

Quando Gustav virou as costas para entrar no hospital Eleonora lhe chamou.

-Perai,Gustav vou com você . Só vim dar um beijo no Bill e já estou indo embora.

Ela abraçou Bill mais uma vez e os dois seguiram para fora do Hospital.

- Vocês dois são um par? – Bill quebrou o nosso silêncio.

-Quem? – Fiz-me de tola.

-Gustav e você?

-Não! – O não saiu depressa e alto demais. Fazendo algumas pessoas virarem para mim.

- Não? Percebi algo no ar!-Ele insistiu.

-Percebeu errado! - Disse alto e rápido novamente.

-Mesmo? – Ele perguntou.

-Sim! Você percebeu errado. Nós saímos no sábado e nos divertimos. Foi isso.

Menti! Eu simplesmente menti para Bill. Naquela manhã, não estava reconhecendo-me. Por que estava pisando em ovos com Bill?  Por que eu não disse do beijo com Gustav? Por que eu tinha ficado tão brava com Ellie?

Estava meio zonza no banco do jardim, então, levantei-me e olhei para o meu relógio. Foi então que percebi que não tinha ficado apenas uma  hora dando aula para Bill e sim duas horas seguidas. A hora voou e eu nem havia percebido.

-Nossa, já são onze horas, estou muito atrasada. Tenho reabilitação e já se passaram quinze  minutos. Bill, até segunda então, tchau.
  
Sorri para ele e corri para a sala 2. Lá eu tinha a minha espera uma criança de dez anos que tinha caído da laje e afetado um pedaço muito importante do cérebro e estava aprendendo a falar. A mãe assistia do lado o pequeno desenvolvimento da filha. Mas, mesmo muito pequeno,  a mãe aplaudia a filha com um sorriso cheio de esperança.
  
A mãe tinha lágrimas nos olhos a cada palavra dita pela pequena, era como se a filha estivesse aprendendo uma outra língua dificílima..Terminei a reabilitação, e estava indo em direção ao meu carro quando o vi sentando no  banco conversando com algumas crianças. Aproximei-me e ele parou de conversar e disse sorrindo:

- Janice e suas manias de chegar sempre quietinha.

As crianças sorriram. E uma delas se levantou e disse alegremente.


- Ele sempre faz isso. Nós nunca conseguimos o assustar. Ele sempre sente a nossa presença. Tenho certeza que ele finge! Não é cego coisa nenhuma.

 -É... Eu já tive essa impressão também. – Eu olhei para Bill séria e percebi que ele mordia o lábio inferior e depois sorriu das nossas colocações, deixando a mostra os dentes brancos e meio tortinhos,que na verdade mesmo tortinhos eram super charmosos.

Jesus, aquilo fez meu corpo arrepiar até os pêlos da orelha. Eu precisava ir embora, eu estava totalmente descontrolada, devia estar na TPM ou no CIO. Não era possível,tudo o que Bill fazia naquela manhã eu via como um gesto sensual que me arrepiava inteira. Para o meu azar, as mães das crianças apareceram e ficamos os dois sozinhos novamente.



 -Nossa hoje o dia foi super corrido. – brinquei com ele.

- Hoje a hora não passou tão rápida, a senhorita que chegou atrasada.

- Bom, fiquei duas horas te dando aula hoje então eu compensei,né? Estou desculpada?

- Hum...Sim! – Ele disse cruzando os braços no peito.

- Estou indo embora nos vemos na segunda. Tchau!

Quando virei-me para ir embora eu o ouvi.

- Quer almoçar comigo? -  A pergunta fez-me parar e virar-me imediatamente.

- Eu quero...É quer dizer...Vamos, podemos ir no Mc. – tentei disfarçar a
empolgação.

-Não! Sou vegetariano! - Ele disse fazendo uma careta.

-Mas, o hamburg do Mc são feitos de carne de minhocas! Minhocas são animais?
Foi a vez dele sorrir com gosto da minha piada. Ele levantou-se e respondeu.

-Tem um restaurante aqui perto não é vegetariano, mas, tem muitas opções boas para pessoas que não comem os pobres bichinhos.
  -Ótimo! Vamos no meu carro e só por que você falou dos pobres bichinhos, eu fiquei com dó. Vou comer algo sem ser tão sanguíneo.

Ele abriu sua mochila e pegou um boné de dentro dela. Colocou-o! Juro que fiquei ali parada olhando para ele arrumar o cabelo dentro do boné. Sim, a minha boca estava aberta Acreditem salivei sem querer. Bill ficava muito mais lindo de óculos escuros e de boné.

Seguimos até o meu carro. Bill subiu no lado do passageiro e seguimos até o restaurante. Era inacreditável Bill me guiando. Quando chegamos no restaurante minha curiosidade foi maior que a vergonha:

-Como você conseguiu guiar-me até aqui?

- Simples! Venho aqui sempre com meus pais e eles vão falando pontos de referência. Quando você é cego outros sentidos ficam mais aguçados, como a lembrança e o toque.

Quando ele disse "o toque" olhei imediatamente para suas mãos e tive vontade de pegá-las e acariciá-las.

Seus dedos eram finos e cumpridos. As unhas bem feitas  e eram ágeis em tudo o que fazia, imaginei ele colocando as mãos no meu rosto e me acariciando docemente, fechei os olhos e levei um susto quando ele se pronunciou:

  -Janice!

 -Oi! - respondi e percebi que um homem já tinha aberto a minha porta e esperava eu sair para guardar o carro.

  Eu tinha muita curiosidade de perguntar se fazia tempo que ele era deficiente visual, se ele tinha nascido daquela forma. Mas, achava que tudo aquilo o chatearia ou o magoaria.

Entramos no restaurante e óbvio todos os garçons o conheciam e vieram o cumprimentá-lo. Era absurdamente incrível o que ele fazia nos lugares. Tudo se iluminava quando ele surgia ou sorria. Sentamos e pedimos. Quando os pedido vieram mais uma surpresa: Ele comia como se não tivesse nenhum tipo de deficiência. E isso me fez crer que ele era deficiente desde cedo.

Almoçamos, conversamos  e nos divertimos muito. Conversamos sobre muitos assuntos, menos da doença dele.

Quando já tínhamos terminado de almoçar, nos levantamos e  Bill sem querer derrubou a garrafa de coca-cola que estava em cima da mesa que se espatifou no chão. Minha primeira reação foi pegar em sua cintura e tirá-lo de perto dos cacos para ele não se machucar!

- Bill, se afaste você pode se ferir. - Eu estou bem, Janice!

Vi um garçom se aproximar e se agachar para limpar a sujeira.

- Desculpa Daniel,  veja o prejuízo. Eu pago! –Bill disse para o garçom.

- Não precisa se desculpar e nem pagar. Bill, foi um acidente.

Estávamos saindo do restaurante e Bill estava um pouco na minha frente quando ouvi um casal comentando:

-É aquele rapaz cego que vem sempre aqui sempre. Judiação! Tenho uma pena. Tadinho!

Pena? Coitado? Minha vontade era voltar e dizer umas boas verdades para aquela nojenta. Como assim? Bill era a pessoa mais doce, mais sensível, mais encantadora, mais espontânea, mais engraçada que eu conhecia. Não tinha nada de coitado. Nada!

 Eu tinha dó dela que estava sentada com uma "cara de merda" com um marido com "cara de nada" que, com certeza, nem amor mais existia entre eles. Ela parou na porta do restaurante e me assustei com os meus próprios sentimentos. Meu Deus! O que eu estava fazendo? Eu estava a ponto de pular no pescoço daquela mulher pelo Bill. Por ele!


-O que foi, Janice? Hoje você esta tão estranha hoje. Que bicho te mordeu?



Até Bill tinha reparado que eu estava calada e estranha. Então, tentei mudar de assunto.


- Você vai embora ou vai ficar mais no hospital?


Perguntei para ele não respondendo à sua pergunta.


- Vou para o hospital tenho que dar mais umas aulas de musicoterapia.


Abri a porta do carro para ele entrar, Bill subiu e então seguimos para o Hospital. Parei o carro e antes de descer ele perguntou:


- Quer descer e assistir uma aula?

- Não vai dar, tenho prova hoje e nem estudei. Prometo que na próxima eu fico, ok?
  
- Tudo bem! Adorei o almoço, obrigada.

-Temos que almoçar outra vez pois te devo um almoço. Quero pagar da próxima vez.

-Nunca! Jamais deixarei que você pague. Sou um cavalheiro.- Ele sorriu e procurou a maçaneta para abrir a porta e quando a achou e abriu-a eu perguntei:

- Quer que eu te ajude a chegar dentro do hospital?

- Onde você estacionou o carro?-Bill me perguntou.
  
- Perto da árvore que sempre sentamos. É só seguir à direita que você chega na recepção.

-Ok!!

Ele pegou algo dentro da mochila dele e desceu do carro. Então, Bill abriu a bengala e seguiu até a recepção. Sem nenhuma dificuldade. Ela, pela segunda vez não conseguiu ligar o carro, ficou ali parada sem conseguir ir embora só para observá-lo. Quando o viu entrar no hospital ela olhou para o retrovisor e disse:

-Janice, eu estou com medo de você!

Dei a partida e fui para sua casa, chegando em casa, subi as escadas correndo e  fui para o chuveiro tomar um banho bem gelado...Muito gelado!

Postado Por: Grasiele

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