sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Resumption - Capítulo 62

 Eu tinha amigos maravilhosos, um emprego que amava e uma vida confortável, mas eu me sentia incompleta, como se não pertencesse àquele lugar. Havia felicidade em minha vida, aqueles que estavam comigo sorriam-me lindamente, seus olhos transmitiam carinho e conforto, mas eu não conseguia absorver nada... Era como se houvesse apenas um corpo presente e nada mais.
Tudo parecia ficar pior a cada segundo e eu me sentia uma intrusa, um fardo que ninguém merecia carregar... Totalmente sem emoção, como uma boneca de pano. Sorrisos me eram dados, mas eu apenas conseguia retribuí-los fracamente.
Alguns dias passaram-se após o retorno de Bill, eu me sentia aliviada por tê-lo ao meu lado mesmo depois de tudo o que havia acontecido e agradecia mentalmente por ter seu sorriso me dando forças para aguentar; Mila estava cada vez mais linda, havia um brilho radiante de felicidade e satisfação em seu olhar e parecia mais protetora do que nunca, o espírito maternal aflorava rapidamente e sua atenção fora voltada para mim; Anne gerenciava a agência à distância e me distraía a maior parte do tempo junto a Camila.
Era bom ter meus amigos por perto, mas não queria que suas vidas fossem interrompidas por minha causa e eu precisava deixa-los viver em paz, então foi o que eu fiz após ter uma longa conversa com todos. Lembro-me dos olhares tristes e compreensivos que recebi, dos suspiros seguidos por choro... Até mesmo Georg, o mais brincalhão, derramara suas lágrimas.
No mesmo dia me despedi de todos com um aperto no peito e parti sozinha para o aeroporto carregando duas malas, meus documentos, meu notebook e minha câmera fotográfica... Eu não tinha ideia de onde iria, apenas sabia que precisava me desvencilhar daquele país, daquela vida por um tempo.
Eu caminhei lentamente pelo grande saguão do aeroporto e parei em frente ao painel que indicava os voos e seus respectivos horários, meus olhos passearam pelas letras... Itália, França, Portugal, Inglaterra todos países lindos e que eu gostaria de conhecer, mas não sozinha.
Suspirei pesadamente e segui em direção às pequeninas lojas de suvenires, observei todas as vitrines convidativas e não encontrei nada que me chamasse a atenção.
Após uma pequena caminhada avistei uma revistaria e adentrei na mesma com o intuito de comprar algumas revistas de turismo, precisava encontrar um destino e era a minha única alternativa. Segui com meus pertences até a área de espera e sentei-me para ler... Tinha em mente “conhecer” alguns lugares e encontrar algo que me chamasse a atenção naquelas páginas. Perdi a noção do tempo lendo sobre cidades maravilhosas, hotéis luxuosos, praias de água límpida, culinária requintada e bares boêmios... Não havia nenhum lugar comparado à minha Alemanha, mas eu necessitava sair de lá.
–Oras, é tão difícil assim escolher um país qualquer? –ouvi-me murmurar.

Respirei fundo e decidi usar uma das minhas estratégias infantis de escolha: fechei os olhos, segurei uma das revistas e abri em uma página qualquer.

–Seja o que Deus quiser! –falei abrindo os olhos, haviam grandes letras em vermelho indicando o país –ALEMANHA?

Havia algo errado comigo e a minha maldita sorte ou o fato de eu ser apegada com todas as minhas forças àquele país tenha influenciado a “escolha”... Eu não sei dizer, talvez o que ouvi muitas vezes seja realmente verdade: “seus pensamentos influenciam diretamente no seu destino”.
Tombei minha cabeça para trás e fixei meu olhar no teto de vidro, o céu azul era iluminado pelo sol tímido de outono e pássaros voavam graciosamente... Um dia tão lindo e eu tentando fugir daquilo tudo...

–Talvez eu não precise sair do país, posso experimentar a reclusão em uma das tantas cidades pequenas e aconchegantes... –pensei alto.

E o primeiro lugar que surgiu em minha mente foi Bohmte, uma pequena cidade localizada cerca de 400km de Berlim, onde passei os primeiros anos de vida junto de meus avós em uma pequena fazenda.
Sorri ao me lembrar de meus avós, eu não os visitava desde que tinha 8 anos e a última vez que os vi foi no meu aniversário de 15 anos, cerca de quatro anos atrás. Levantei da cadeira rapidamente e segui em direção à saída, embarquei em um táxi e pedi à taxista que me deixasse na estação de trem de Berlim.
–Desculpe a minha intromissão, querida, mas está tudo bem? –a mulher tinha uma voz tranquila. –Parece abatida.

–Estou com alguns problemas, mas sinto que logo os resolverei. –disse sinceramente, eu realmente estava com aquela boa sensação.

–Claro que vai! –sorriu olhando-me através do espelho retrovisor. –Vou rezar por você...

–Pode me chamar de Duda. –disse sorrindo, havia algo naquela mulher que me fazia sentir confortável.

–Meu nome é Antonina, mas pode me chamar de Nina.


Eu e Nina engatamos uma longa conversa, na verdade ela falava mais do que eu... Contou-me sobre seu falecido marido, a falta que sentia de seu filho único e do amor pelo volante.
Era estranho ver que, mesmo sozinha, minha mais nova amiga vivia alegremente transmitindo a sabedoria de seus 55 anos e ela era linda, mal parecia que o tempo havia lhe mudado... Talvez não exteriormente, mas interiormente, com toda certeza, haviam muitas marcas deixadas pela vida e o sofrimento.
De alguma forma Nina me fez sentir mais forte.
–Chegamos, querida. –Nina disse estacionando em frente à estação de trem.

–Quanto...

–Não vai lhe custar nada, ajudar uma amiga não tem preço! –sorriu acolhedora.

–Mas, Nina... –tentei convencê-la do contrário.

–Não insista querida!

–Tudo bem, mas eu quero retribuir de alguma forma...

–Você vai retribuir da melhor forma possível: sendo feliz! –seus olhos brilharam e um sorriso brilhante surgiu em seu rosto.

Despedi-me e segui com minhas malas até uma das máquinas de emissão de tickets, pouco menos de trinta minutos depois embarquei no trem e me acomodei em um assento, recostando minha cabeça no vidro da janela e, enquanto observava a paisagem passar por meus olhos rapidamente, adormeci.
Acordei poucos instantes antes de o trem parar na estação de Bohmte e em seguida desembarquei, segui para um pequeno ponto de táxi onde embarquei em um carro. O motorista era um simpático bigodudo com grandes bochechas rosadas.
–Desculpe perguntar, senhorita, mas por um acaso não é a neta dos Müller?
–Sou sim. –respondi sorrindo. –O senhor os conhece?

–Claro que sim! –riu-se. –Todos conhecem seus avós na cidade... E a senhorita lembra muito a sua avó.

–Obrigada. –sorri.

–Eles vão ficar tão contentes por vê-la! –seus olhos azul-piscina brilharam.

Durante os primeiros minutos ouvi atentamente o senhor tagarelando sobre as mudanças na cidade e comentava, mas depois deixei o homem em seu monólogo e passei a observar a paisagem. O vento fresco chocava-se sutilmente contra meu rosto, o aroma gostoso das árvores passeava em minhas narinas e a grama verde do campo me fez viajar em lembranças da infância: passeios a cavalo, piqueniques aos pés das cerejeiras, noites em frente à lareira, acampamento no quintal, fins de tarde observando o pôr-do-sol em uma roda de música...
–Chegamos senhorita! –o homem puxou-me de volta à realidade.

Pisquei algumas vezes antes de avistar meu avô montado em seu cavalo negro e, segundos depois, senti lágrimas escorrendo sem controle por minhas bochechas. Desci do carro tentando manter a calma para não assustar o cavalo, meu coração saltitava feliz por estar de volta ao lugar a que sempre pertenci.
–Heiki, querida, venha ver quem está aqui! –meu avô gritou, lágrimas jorrando de seus olhos cor de mel.

–O que foi, Frank? –minha avó surgiu na varanda da grande casa de madeira, seus olhos castanhos arregalaram-se e em seguida encheram-se de lágrimas.

Não contive meu impulso e corri para os braços de minha avó apertando-a como se o mundo fosse acabar, afaguei seu longo cabelo branco e beijei-lhe as bochechas magras.
–Não acredito que esteja aqui, minha garotinha! –vovó exclamou beijando minha bochecha. –Estou tão feliz em vê-la...

–Eu também, vovó! –sorri tentando conter as lágrimas que insistiam em escapar.

–Como você cresceu! Parece mais bonita do que eu me lembro e tão adulta também... Não é, querido?

–Concordo plenamente. –a voz grossa de vovô soou me fazendo olhá-lo.

Os braços cumpridos e fortes de meu avô me envolveram em um “abraço de urso” levantando-me do chão por alguns segundos, me fazendo sentir como se fosse criança novamente.
–Estou muito feliz em ver você, embora pareça triste e abalada por alguma coisa... –meu avô sorriu soltando-me. –Algum problema, querida?

Meu avô sempre fora muito observador e, além disso, temos uma grande conexão, o que permite que ele “leia” minhas expressões e sinta qualquer alteração em meu estado de espírito ou humor, por menor que seja.
–Eu vou lhes contar tudo, mas primeiro preciso pagar a corrida de táxi e pegar minhas malas. –disse tentando manter o sorriso no rosto.

–Pode deixar que seu avô resolve isso com o Wagner, vamos entrar e servir o chá. –vovó disse segurando minha mão e guiando-me para dentro da casa.

A casa continuava a mesma desde que eu tenha consciência de que se enfiasse o dedo na tomada ia levar choque, tudo permanecia no mesmo lugar de maneira aconchegante. Vovó e eu servimos o chá e colocamos sobre uma bandeja de prata junto de alguns biscoitos e seguimos para a sala, onde vovô já estava acomodado em sua grande poltrona.
–Então, conte-nos sobre a sua vida. –vovô pediu após vovó e eu acomodarmo-nos no sofá.

Contei sobre tudo o que havia acontecido em minha vida nos últimos anos, inclusive a mudança repentina e os relacionamentos um tanto confusos que mantive até pouco tempo e que ainda estavam mal resolvidos. Todas as lembranças voltavam como um flashback e após terminar meu desabafo meu rosto estava tomado pelas lágrimas.
–Tenho certeza de que tudo vai se resolver, minha querida. –vovó disse afagando meus cabelos.

A sua felicidade virá com as flores das cerejeiras, o inverno está por vir... Espere e verá. –a voz de vovô soou calma como a brisa.

Postado por: Grasiele

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