- Que sonho estranho.- Me espreguicei abrindo a maior bocarra num bocejo preguiçoso. – Que cheiro é esse? - Respirei ao sentir um cheiro de café.- Ué, não chamei o Damon para vir pra cá.- Comentei comigo mesma, me levantando da cama, ou melhor, me arrastando para fora dela e indo para a cozinha.
Ao abrir a porta levei um susto.
- Bom dia.- Bill sorriu largamente colocando duas xícaras sobre a minúscula mesa de vidro. - Eu fiz café.- Disse agora observando minha cara de “Não estou entendendo nada”. - Esqueceu de mim? - Perguntou levantando a sobrancelha.
- Não, quer dizer... eu pensei que ontem tivesse sido um sonho, mas parece que não. – Disse fazendo uma cara indiferente e indo até a cozinha.- O cheiro ta bom pelo menos, você aprendeu a fazer café?
- Eu gosto muito de café. - Disse animado sorrindo de novo.
- Nunca vi alguém tão feliz por causa de café, mas enfim, no céu não deve ter café né? - Disse indo me sentar e Bill veio em minha direção e afastou a cadeira para que eu pudesse sentar. - Obrigada.- Agradeci o olhando enquanto ele ia até a cafeteira.
- Eu não sei se ficou bom, mas fiz umas coisas que já comi também, panqueca o nome, eu vi que tinha a massa pronta na geladeira e fiz conforme as instruções. – Disse olhando o prato cheio de panquecas.- Na embalagem estava falando que era aconselhável servir com mel ou chantilly, então eu fui comprar os dois. – Disse colocando o chantilly e em seguida o mel sobre a mesa.
Eu fiquei parada olhando para o prato de panquecas, elas estavam perfeitas.
- Que injustiça... – Pensei alto, agora olhando para ele soltando sorriso aberto e inconformado. - Eu sempre tentei fazer essas malditas panquecas, e as filhas da mãe nunca saíam assim, sempre ficavam murchas ou queimavam. Fala a verdade, você fez alguma mandinga angelical pra deixar elas assim perfeitas não fez não? - perguntei o fitando com olhar duvidoso.
- Eu só fiz o que estava indicado na embalagem. - Respondeu dando ombros e fazendo bico de peixe.
- Certo, você está há o que... dois dias na Terra? E sabe fazer panquecas e café perfeitamente, e eu nasci aqui e não sei fritar um ovo. – Disse comendo um pedaço da panqueca e não pude evitar de soltar um “hmmmmm que delícia”, pois aquilo estava o paraíso... ironicamente. - Você não vai comer? - Perguntei com a boca cheia, não conseguia parar de comer as panquecas.
- Não, eu não preciso me alimentar muito. - Disse puxando uma cadeira e sentando.
- Mas, então você fez café só pra mim?
- Sim.
- Não precisava.
- Precisava, se não fizesse você não teria o que comer.
- Eu como na lanchonete, não precisava perder seu tempo comigo. - As garfadas nas panquecas eram cada vez maiores, fazendo parecer que eu estava morrendo de fome, mas era pura gula, pois aquilo estava bom demais.
- Eu estou aqui justamente para perder meu tempo com você, esqueceu? - Disse com os cotovelos sobre a mesa e as mãos sobre o queixo. Ele era muito bonito sem maquiagem.
- É né. - Disse balançando a cabeça enquanto tomava um gole de café. – Meu Deus! Esse é o melhor café que eu já tomei, e olha que eu recebo mil elogios pelo meu café, mas o seu... é muito melhor. - O olhei rapidamente e voltei a dar outro gole no café.- Bom, já que vamos passar um tempo juntos, acho que você precisa me dar algumas explicações. – Terminei afastando o prato de panquecas e o café.
- Quais? - me perguntou agora encostando na cadeira e cruzando os braços.
- Primeiro, desde quando você desceu?- perguntei apontando para o teto.
- Três dias.
- Hmm, e esse corpo não é seu, ou é?
- Não, não é meu.
- De quem é? – Franzi a testa curiosa.
- Não posso falar sobre isso. – Desconversou me olhando fixamente.
- Como não? Você possuiu o corpo de alguém, como não pode falar sobre isso? É segredo celestial?
- Sim, é. Eu posso responder suas perguntas, qualquer uma, mas nenhuma relacionada ao meu recipiente.
- Seu... recipiente? É assim que vocês nos chamam? De recipiente?
- Exato.
- Ta ok. Quanto tempo você tem para ficar aqui na Terra?
- Vai depender de você, o tempo é indeterminado, porém se eu conseguir alcançar meu objetivo amanhã, eu volto amanhã.
- E o seu objetivo é o que especificamente?
- Fazer com que você recupere sua fé, e pare de se destruir.
- Seu objetivo é me levar para igreja e me converter então?
- Não, você não entendeu. Não é algo que envolva uma religião, fé e religião não são a mesma coisa, você perdeu, ou melhor, esqueceu da sua fé, e eu preciso que você a recupere, só isso.
- Não vai ser fácil, já estou avisando. Eu acredito em coisas boas, só não acho que seu Deus ajude em alguma coisa. Minha vida é uma merda, mas eu vejo coisas muito piores. Se supostamente somos filhos de Deus, que tipo pai deixa um filho morrer de fome? De sede? Que Deus é esse que deixa pedófilos e traficantes vivinhos e saudáveis e crianças puras,cheias de vontade de viver, como a Vitória, doentes com os dias contados para morrer? - Fiz uma pausa para olhar a face de Bill que estava séria, e ele prestava atenção em cada sílaba que saía da minha boca. - Não meu amigo, vai ser MUITO difícil você me provar que existe um Deus que se importa conosco. Se ele existe ele só se preocupa com o umbigo dele.
- Você está certa.- Disse calmo e sua resposta me fez ficar espantada. – Você tem razão em se questionar, mas isso é fruto do livre arbítrio. Deus não nos manipula como fantoches, Ele deu a liberdade de escolha para o ser humano, e as doenças e a maldade são fruto das escolhas feitas pelos homens. Enfim, nós teremos tempo, eu estou aqui para lhe ensinar, e não para lhe forçar, é algo que tem ocorrer naturalmente, e de certa forma eu também estou aqui para aprender com você. - terminou se levantando e pegando as coisas da mesa para guardar. - Você precisa de mais alguma coisa?
- Não... não preciso, obrigada.- Ainda estava pensativa e surpresa pela reação dele ao meu desabafo, ele parecia tão seguro de que iria me mudar, e não parecia estar com pressa. - Bom eu preciso ir, a Lourdes deve estar me esperando já. Você pode ficar aqui se quiser.
- Não, eu quero ir com você, posso? - Pediu colocando as louças na pia.
- Ta bom, mas lá é tão chato, você vai ficar entediado.
- Não, não vou.
- Você que sabe, mas se troca antes, eu vou me trocar e já venho.- Me levantei da mesa e fui para meu quarto, coloquei uma calça jeans clara, um top preto, um cachecol lilás e um casaco de lã preto. Sai do quarto ele estava todo de preto e com seu sobretudo de couro, o cabelo estava intacto, para cima e avante. Deus como aquele punk era lindo!
- Vamos? - Perguntei o olhando de cima a baixo.
- Vamos. - Respondeu como uma criança animada para ir ao parquinho.
quarta-feira, 6 de julho de 2011
Angel In Disguise - Capítulo 6
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